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Eleições nos EUA

Kamala pode incentivar mais eleitores a votar, e isso importa

Troca de nome animou doadores e fazedores de meme em país onde voto é facultativo

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São Paulo

A troca do nome de Joe Biden pelo de Kamala Harris na chapa democrata para a Casa Branca não garante caminho aberto para a vitória em 5 de novembro, mas é inegável que ela abastece a campanha do partido com uma energia não vista após Barack Obama se eleger em 2008. Lá se vão 16 anos.

Há indícios desse "boost". Primeiro, nas 24 horas após seu nome aparecer na carta de desistência de Biden como a melhor opção para substituí-lo, a ex-procuradora-geral da Califórnia, ex-senadora e atual vice-presidente amealhou US$ 81 milhões em doações (R$ 450 milhões). O montante é histórico e veio de 888 mil pessoas, das quais 60% não haviam aberto a carteira a ninguém neste pleito, segundo seu comitê eleitoral.

A vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, fala durante evento no gramado da Casa Branca, em Washington
A vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, fala durante evento no gramado da Casa Branca, em Washington - Brendan Smialowski - 22.jul.2024/AFP

Esse dado importa porque, além de encher o caixa da campanha, pessoas que dão dinheiro a um político tendem a de fato... votar. Além disso, microdoações deram impulso e lastro à campanha de Obama como força de renovação política, algo que Kamala e Trump (até certo ponto) emanam, mas Biden, decano do Senado, não.

Como nos Estados Unidos o voto é facultativo, motivar o eleitor é crucial —eis aí, aliás, um dos motivos de as pesquisas por lá terem mais dificuldade em apontar o resultado final.

Afinal, sem obrigatoriedade, obstáculos brotam até a urna: falta de transporte (algo frequentemente usado para excluir eleitores mais pobres), perder um dia de trabalho (a eleição nos EUA ocorre sempre em uma terça, porque na época dos "founding fathers" era preciso viajar de carroça aos distantes centros de votação, e não é feriado); o clima (fila sob sol? Tempestade? Precisa querer muito).

Sobretudo, pesa o desânimo com os candidatos, venha ele da descrença na aptidão de seu preferido para fazer diferença ou da baixa expectativa de que ele possa vencer.

Por tudo isso, embora seja difícil supor que um eleitor democrata com dúvidas sobre a capacidade de Biden o troque por Trump, não é improvável que essa pessoa desista de sair de casa para lastreá-lo. Salvo, claro, se a ojeriza ao empresário convertido em político prevalecer, algo que explicou parte do índice de comparecimento recorde em 2020, quando 2 de cada 3 americanos aptos a votar o fizeram.

Outro sinal da injeção de adrenalina que a campanha democrata recebeu é a enxurrada de memes e declarações de artistas e intelectuais a favor da vice-presidente.

Não, nem o melhor dos memes nem o hit de Beyoncé converterá o voto de quem rejeita a plataforma de centro-esquerda do partido (ou esquerda, no caso da candidata, embora na quase-socialista Califórnia sua fama seja de moderada). Ambos, contudo, falam efetivamente ao eleitor jovem.

E, se por um lado o grupo dos 18 aos 29 anos tem se tornado cada vez mais participativo (55% deles votaram em 2020, o maior índice desde 1972, segundo a consultoria Statista), por outro ele ainda está abaixo da média nacional, o que pode indicar (1) terreno a conquistar e (2) desconexão desse público com as mensagens políticas de praxe.

Ademais, a torrente viral tanto reflete que Kamala capturou a atenção do público —pouco mais de uma semana após Trump ser alvo de atentado— quanto lhe oferece vitrine ampla e reverberação longa para sua campanha, o que pode animar quem não pensava em votar.

E como Kamala, 59, aparece nesses memes?

Dançando (muito). Rindo (sempre). Às vezes trocando palavras, mas saindo com graça por cima (Joe, aprenda). E usando a oratória polida por anos de tribunal para apresentar propostas e criticar Trump de forma eloquente, tudo em intervalos e cenas que funcionam em redes sociais, o canal de massa desses nossos tempos. O cansaço e o etarismo que abateram Biden pairam agora sobre Trump, que depende de seu jovem vice, J.D. Vance, para fazer frente à inquietude da adversária.

Se isso será suficiente para derrotar a azeitada máquina eleitoral de Trump, em um sistema onde o que conta não é ganhar o voto de mais gente e sim obter maioria nos estados de maior peso no anacrônico colégio eleitoral, reza o bom senso que é cedo demais para prever. Faltam 105 dias até a eleição.

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