Andanças na metrópole

As camadas de história encobertas em construções, ruínas e paisagens

Andanças na metrópole - Vicente Vilardaga
Vicente Vilardaga

Parque do Rio Bixiga, um projeto dionisíaco

Crescem as possibilidades do sonho de Zé Celso virar realidade

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São Paulo

Impossível ser contra a instalação do Parque do Rio Bixiga, no quadrilátero das ruas Jaceguai, Abolição, Japurá e Santo Amaro, na Bela Vista. A manifestação convocada pelo Teatro Oficina Uzyna Uzona, no último dia 25, aniversário da metrópole, percorreu o bairro e gritou que a comunidade não vai fraquejar enquanto a área, que pertence ao grupo do empresário Silvio Santos, não for desapropriada e ficar coberta por grandes árvores e gramados aprazíveis. Uma grande energia transformadora emanada pelo diretor José Celso Martinez Corrêa, que morreu em julho do ano passado, continua estimulando seus discípulos a demonstrar uma vontade de lutar até alcançar a grande conquista.

Numa região carente de áreas verdes e deteriorada, o Parque do Rio Bixiga, ao lado do Teatro Oficina, será um sopro de oxigênio e um raro local de lazer. No lugar de um vazio urbano surgirá algo realmente útil e bom por definição. Estranho é o sujeito que não quer um parque ou uma praça perto de casa ou que moradores de outros bairros tenham o mesmo privilégio. Quem se opõe a esse tipo de equipamento público é insensível ou tem uma inteligência precária. Até porque a única coisa que existe no terreno destinado ao novo parque é um estacionamento.

Imagem mostra um estacionamento
Estacionamento ao lado do Teatro Oficina que pode virar um parque - Vicente Vilardaga

Maldito estacionamento. Numa cidade em que os grandes ícones urbanos viram terrenos para estacionar carros, seria estimulante inverter a situação. Seria uma transformação carnavalesca, dionisíaca. Os estacionamentos ocupam velhos cinemas, fábricas e vilas de casas operárias e ver um deles desaparecer substituído por um parque será um sinal de desenvolvimento urbano e evolução civilizacional. Além disso, em vez de um faraônico projeto imobiliário, como quer Silvio Santos, surgirá uma aprazível área verde com 11 mil metros quadrados (metade da área do Parque Augusta, que tem 23 mil metros quadrado) e espaços para crianças e idosos.

O que acontece hoje em São Paulo é uma completa inversão de valores, onde prédios históricos e terrenos vazios são tratados como estorvos ou oportunidades de verticalização pelas forças do mercado. São obstáculos ao progresso e condenados a se transformarem em arranha-céus. A última coisa que se pensa é em usar o prédio antigo para uma instalação cultural ou transformar um terreno de estacionamento em uma área de uso público.

Fachada do Teatro Oficina
Homem passeia na calçada diante do Teatro Oficina - Vicente Vilardaga

A criação do Parque Rio Bixiga era um grande objetivo do diretor José Celso Martinez Corrêa, que morreu sem ver seu sonho realizado e lutando para impedir a instalação de um conjunto de três prédios de 28 andares no terreno. Passou 40 anos travando uma disputa na Justiça com Silvio Santos em que pelo menos conseguiu travar as ambições imobiliárias do apresentador de TV. Não nasceu o parque, mas também não subiram as torres. O terreno ficou no limbo dos estacionamentos.

Os discípulos de Zé Celso, porém mantêm as armas de pé e tem demonstrado vigor para defender as ideias e desejos do dramaturgo. A festa do dia 25 reuniu milhares de pessoas e foi uma clara demonstração de força. Em fevereiro de 2020, a Câmara Municipal aprovou um projeto de lei que previa a criação do parque, mas o então prefeito em exercício, Eduardo Tuma, vetou a iniciativa alegando que extrapolava a competência do Poder Executivo.

Parque do Rio Bixiga
Manifestantes exigem instalação de parque - Vicente Vilardaga

Agora há grandes chances do parque vir a nascer e florescer. A Prefeitura, em acordo com o Ministério Púbico, anunciou em dezembro que pretende destinar R$ 51 milhões para instalar o parque. O dinheiro virá da universidade privada Uninove que assinou um termo com o Ministério Público para destinar R$ 1 bilhão para evitar um processo por suspeita de pagar propina a fiscais para evitar a cobrança de impostos. O acordo envolve a tentativa de comprar o terreno de forma amigável diretamente do grupo Silvio Santos ou por meio de desapropriação. Procurada, a Uninove não quis falar sobre o assunto. Resta que o sopro de Dionísio vença a política e as forças do mercado e converta o abjeto estacionamento num parque bucólico.

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