Andanças na metrópole

As camadas de história encobertas em construções, ruínas e paisagens

Andanças na metrópole - Vicente Vilardaga
Vicente Vilardaga

Mais um vez o Bar Balcão está sob ameaça de fechar

Abaixo-assinado encabeçado pelo escritor Mário Prata tenta impedir destruição

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São Paulo

O Bar Balcão, na esquina da rua Melo Alves com a alameda Tietê, nos Jardins, está mais uma vez sob ameaça de fechar. Símbolo da vida boêmia na cidade, reduto de escritores e intelectuais, o estabelecimento corre o risco de ser engolido por um grande empreendimento imobiliário que reduziria seu prédio, o mais antigo do quarteirão, a cinzas e apagaria uma parte importante da memória da cidade.

A continuidade da existência do Balcão, que completou 30 anos em março e é conhecido pela sua bancada de 25 metros em zigue-zague e pelos belos quadros, parecia assegurada depois de uma primeira ameaça de fechamento em meados do ano passado.

Na ocasião, aconteceram conversas do seu proprietário, Francisco Millan, o Chico, com a empresa multinacional Paladin Realty Partners, que estava à frente da incorporação. Discutia-se a coexistência do bar com o projeto imobiliário. Porém, a Paladin, aparentemente disposta a chegar num acordo, desistiu de construir um edifício no lugar por questões de insegurança jurídica.

Fechado desde 1º de fevereiro, bar Balcão retoma as atividades nesta terça-feira, dia 10
Interior do Balcão com sua bancada de 25 metros em zigue-zague e um quadro de Roy Lichtenstein - Divulgação/

A situação, então, parecia sob controle. Mas uma nova incorporadora, a Global Realty Brasil, assumiu o projeto nos últimos meses e tudo retornou à estaca zero. O risco real do Balcão desaparecer voltou a assombrar os seus donos e frequentadores. Millan teve um contato rápido com um representante da Global que não deu qualquer garantia sobre o futuro do bar e informou que já estão sendo assinados contratos de opção de compra de imóveis na vizinhança.

"Não tenho ideia do que vai acontecer. A outra incorporadora, muito mais forte do que essa, desistiu, agora é aquela coisa do futuro a Deus pertence. Você luta, faz o que tem que fazer, mas não tem certeza de nada", diz Millan. "A Paladin saiu de cena no fim do ano, pensei que estava livre, salvo, mas aí apareceu essa nova."

Chico Millan na festa de 30 anos do Bar Balcão, em março: incerteza sobre o futuro do negócio

Millan conta que ainda está tudo "muito aéreo", só teve um encontro com o funcionário da Global e que nada foi formalizado. Quanto à proprietária do imóvel, que é alugado, ele tampouco sabe dizer se ela tem intenção de vendê-lo. "É uma questão pessoal, mas imagino que a locadora tenha interesse em manter a renda, até porque essas incorporadoras costumam funcionar na base da permuta em vez de comprar o imóvel efetivamente."

Para tentar reverter a situação de incerteza, um abaixo-assinado foi lançado pela plataforma Change.org Brasil, no último domingo, com a reivindicação de manter o Balcão intacto no mesmo local. Millan diz que não se trata de um ato de desespero e sim de uma iniciativa para mostrar que o lugar existe, ainda está vivo e é um patrimônio da cidade. O documento, que até terça-feira à noite tinha 4615 assinaturas, foi encabeçado pelo escritor Mário Prata, frequentador assíduo do bar desde que foi aberto.

"O Balcão é o meu bar. Quase fui sócio dele há 30 anos, lá aconteceram 900 lançamentos de livros e não sei quantos leilões e exposições. Meu filho conheceu a mãe dos meus netos nesse bar", conta. "É um espaço que merece ser preservado e, no entanto, corre de novo o absurdo risco de fechar as portas, num assustador e avassalador contexto de desfiguração que vem dominando a nossa cidade."

O escritor Mário Prata em seu apartamento em Higienópolis: contra a verticalização desenfreada

Na verdade, o que acontece no Balcão é um exemplo do que vem ocorrendo em todas as regiões de São Paulo. Do dia para a noite quadras inteiras com estabelecimentos comerciais tradicionais são demolidas para dar lugar a prédios de apartamentos modernosos. Prata, que viveu 22 anos em Florianópolis, e retornou para a cidade em outubro do ano passado, se revolta com a situação.

"A minha bronca, além do bar Balcão, que eu adoro, é com toda a cidade. Estou assustado com isso. Tem quarteirões que eu não reconheço mais", diz Prata, crítico da verticalização desenfreada. "Estou morando na esquina das ruas Sergipe e Itambé e derrubaram o quarteirão inteiro, só sobrou um bar, que tem data para entregar a chave. Havia um prédio de oito andares na quadra que foi derrubado em seis dias. Sabe o que é isso? Ninguém tem ideia do que vão fazer ali."

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