Ciclocosmo

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Ciclocosmo - Caio Guatelli
Caio Guatelli
Descrição de chapéu ciclismo tecnologia

Excesso de tecnologia tem transformado a bicicleta em outra máquina

Simplicidade da "magrela" se perde em meio a motores, telas e botões

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Um dispositivo que modifica a altura do selim durante a pedalada, o dropper post, se tornou protagonista na vitória do esloveno Matej Mohorič na Milão-São Remo —prova clássica do ciclismo de estrada, realizada no dia 19 de março, no norte da Itália.

De acordo com o próprio campeão, sua vantagem de 2 segundos sobre o pelotão, ao fim dos 293Km, é resultado do ganho aerodinâmico proporcionado pelo uso inusitado deste aparato na prova de estrada.

Ao comentar a adaptação do dropper post em sua bicicleta, Mohorič comparou a evolução das bicicletas ao automobilismo: "[o ciclismo] está ficando como a Fórmula-1. Antes eram apenas os pedais do acelerador e do freio, agora eles tem centenas de botões".

É verdade. E além dos botões, que se multiplicam a cada lançamento, a indústria da bicicleta tem incluído tantas conexões eletrônicas e acessórios revolucionários que o velho hábito de pedalar também tem se modificado.

Ilustração antiga mostra o que foi uma das primeiras bicicletas
Uma das primeiras versões da bicicleta: pés tocavam o chão - Science & Society Picture Library

Alguns modelos sofreram tanta interferência tecnológica que suas aparências carregadas de carenagens, suspensões e sistemas elétricos e hidráulicos se aproximam muito mais das motocicletas do que daquilo que realmente são.

A descrição técnica das mais caras poderiam muito bem servir a uma peça comercial de qualquer fabricante de motos: chassi monobloco em fibra de carbono, freios a disco com acionamento hidráulico, câmbio eletrônico com conexão Bluetooth, porta-trecos na carenagem, suspensão inteligente, GPS com conexão wifi e tela sensível ao toque…

Foto mostra ciclista "voando"em meio a árvores
Uma versão mais recente: tem momentos que nenhuma parte do ciclista nem da bicicleta tocam o chão - Specialized

Outras usam disfarces e subterfúgios para continuarem sendo chamadas de bicicletas, mas seus motores (isso mesmo, motores!) são capazes de levar qualquer tiozinho por mais de 100Km de estrada sem derramar uma gota de suor.

Tem bicicleta retrô que por baixo da fantasia é uma verdadeira moto. Essas coisas só precisam de um leve giro nos pedais para acionar um super motorzão elétrico de 560W —os próprios fabricantes se orgulham em dizer que tal valor corresponde a força de até quatro ciclistas.

Não bastasse a sede pelos motores, freios hidráulicos, câmbios automáticos e suspensões inteligentes, existe hoje um novo jeito de pedalar. Com um computador de bordo, GPS, ou aplicativo de celular, o ciclista tem que rastrear cada metro do rolê para em seguida exibir todo o trecho pedalado na rede social dos atletas.

Imagina pedalar 20, 30, 100 Km e não deixar tudo isso bem bonito para todo mundo ver? Não exibir mapas, fotos, altimetria, e os próprios recordes da pedalada passou a ser o mesmo que ter ficado morgando em casa.

Se o ciclismo evoluir como a Fórmula-1, como prevê o campeão esloveno Matej Mohorič, corremos o risco de ver o equipamento se tornar mais relevante que a experiência.

O esloveno Matej Mohorič ao vencer a clássica Milão-São Remo com sua bicicleta adaptada. - AFP

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