A ciclovia da avenida Inajar de Souza, que liga o extremo norte de São Paulo às ciclovias da região central, tem se tornado uma alternativa para muitos moradores da periferia insatisfeitos com as viagens de ônibus.
Em alguns dos bairros mais afastados na zona norte, como Jardim Peri, Jardim Antártica ou Jardim Vista Alegre, no distrito da Brasilândia, os deslocamentos sempre foram muito complicados. Apesar de abundantes, as linhas de ônibus que cruzam os tortuosos caminhos dali não desembocam rapidamente no corredor expresso mais próximo, o da avenida Inajar de Souza.
Quem pretende ir ao centro ou à zona oeste, partindo do miolo desses bairros, e não quer (ou não pode) usar carro ou moto, tem que escolher entre três opções: embarcar num único ônibus que serpenteia por vários bairros por cerca de 2 horas, fazer demoradas baldeações até chegar numa linha expressa e lotada —o que também leva cerca de 2 horas—, ou montar numa bicicleta e fazer o mesmo trecho na metade do tempo.
Enquanto a linha 6 do Metrô não fica pronta, essas são as únicas opções para uma grande população da zona norte que precisa se deslocar diariamente ao centro ou outras regiões da cidade.
Apesar de mais rápida, a opção de ir pedalando pode ser cansativa e requer atenção com as armadilhas pelo caminho.
Contudo, para quem já se adaptou, a experiência pode trazer outros benefícios à vida.
O zelador Antônio Ataíde, 60, é um dos que não larga mais esse hábito. Morador do Jardim Antártica, ele pedala diariamente 32 Km para ir e voltar do trabalho, em Perdizes (zona oeste). Começou há dois anos, por consequência da pandemia. "Desde então só vou ao trabalho de bicicleta. As duas horas e meia indo em ônibus caíram para 55 minutos pedalando. Ganhei tempo, perdi peso, e o médico disse que minha saúde melhorou 90%".
Para ir ao trabalho, a metalúrgica Gilmara Martins dos Santos, 43, não precisa sair da zona norte, mesmo assim percorre 20 Km por dia nos trajetos de ida e volta entre sua casa, no Jardim Elisa Maria, e o trabalho, no bairro do Limão. "Pedalando ganho 20 minutos em cada trecho. Mas nem é por isso, é por que me sinto feliz pedalando".
O motorista Ribanilson Aquino, 50, mora no Jardim Vista Alegre e trabalha na Barra Funda. Sai de casa pedalando todos os dias às 6h para entrar no trabalho às 7h. "De ônibus precisaria sair às 5h", disse ele.
Para Roberson Miguel, 42, fundador do coletivo Ciclo Zona Norte, casos como os de Antônio, Gilmara e Ribanilson mostram como a oferta de ciclovias ajuda a atrair mais adeptos, alivia o trânsito e traz benefícios de saúde e econômicos para toda a sociedade.
Contudo, ele ressalta que, mesmo diminuindo o tempo de viagem e trazendo benefícios à saúde, o longo deslocamento em bicicleta não é a solução ideal. "A maioria das pessoas não tem essa capacidade [de pedalar longos trechos por dia], é um esforço físico muito grande, e também há a insegurança de usar a bicicleta em uma estrutura cicloviária precária".
Miguel conclui que o trabalhador que troca o ônibus por longas distâncias em uma ciclovia precária continua fazendo um sacrifício. "Além de ficar cansado com a distância pedalada, se expõe ao stress de uma ciclovia que tem trechos sem proteção ou sinalização alguma, passar por ali é um risco extremo".
O trecho apontado por Miguel fica na ciclovia Inajar de Souza entre a avenida Deputado Emílio Carlos e a rua Edson Andrade Silva. São 400 metros onde os ciclistas dividem espaço com carros e ônibus.
Em nota, a SPTrans informa que o bairro da Brasilândia na Zona Norte é atendido por 67 linhas, sendo 34 que saem de dentro do distrito, 20 linhas que passam por dentro e outras 13 que circulam no entorno. A companhia indicou que o trecho da Avenida Inajar de Souza, com corredor exclusivo para ônibus, tem início a partir da Avenida General Penha Brasil, no sentido centro, e é atendido pelas linhas 209P-01 e 209P-10, 9004-10, 9005-10, 9005-41, 9005-42, 9090-10, 2013-10 e N138-11 (noturna). E que os passageiros do Distrito da Brasilândia, interessados no acesso à parte posterior do corredor, deverão utilizar as linhas com integração no Terminal Cachoeirinha.
Esta foi a terceira de uma série de 6 reportagens sobre a estrutura cicloviária de São Paulo. No próximo domingo (10/7), o Ciclocosmo abordará as características particulares das ciclovias da região sul da cidade.
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