Neste Domingo, dando sequência ao Ensaio Palavra-Imagem especial de Abril com vozes femininas, o texto da poeta e editora Alice Sant'Anna atravessa as esculturas extremamente delicadas do japonês Yazuaki Onishi. Com uma escrita muito particular, num poema da Alice a gente encontra a luz suave, delicadeza, o sussurro, o cotidiano e o inesperado. Ela pede de quem lê calma e olhar atento para as descobertas, as grandes e as minúsculas. O vazio pode ser expresso? Vazios podem ter volume? O espaço pode ser esculpido? Onishi dedicou sua produção artística ao poder transformador do espaço, abrindo caminhos para novas percepções de volume, linhas, vazios e silêncios, encorajando o espectador a colocar sua própria imaginação na cavidade. Com esses silêncios misturados e sobrepostos, te convido a desbravar um espaço inventado.
é o último dia do ano
poderíamos dizer o apagar das luzes
às nove da noite desligamos a casa
e vamos para a varanda
na escuridão esperamos até que os olhos se acostumem
os vagalumes chegam aos poucos
e de repente são dezenas
assistimos à farra em silêncio
broches que acendem e apagam no breu
não digo nada mas em segredo
duvido um pouco que existam
as luzes mais distantes são sempre estrelas ou naves
as luzes assim tão próximas só podem ser fruto da imaginação
deixamos que você se decida por si
(se visse os bichos apagados
na luz dura da casa
com certeza teria medo)
a essa altura você já deve ter percebido
há coisas que beiram a fantasia
para quem está o tempo todo sendo apresentado ao mundo
se aparecesse um cachorro de duas cabeças
você não se espantaria
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