O Tribunal de Justiça de São Paulo sugeriu à presidente do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), ministra Rosa Weber, retirar da pauta, para aprimoramento dos estudos, a proposta das promoções com incentivos à participação institucional feminina no Judiciário.
O procedimento está previsto para discussão na próxima terça-feira (19), sendo relatora a conselheira Salise Sanchotene.
Para evitar "o risco de consolidação de situações irreversivelmente injustas", o TJ-SP julga necessário "maior reflexão e debate do importantíssimo tema, que afeta profundamente a vida profissional e o ideal de carreira de todos os magistrados do país".
O ofício foi assinado, nesta quinta-feira, pelo presidente Ricardo Mair Anafe e pelo corregedor-geral do Estado de São Paulo, Fernando Antonio Torres Garcia.
O tribunal paulista sugere a intimação dos tribunais e das associações de classe para que se manifestem acerca da minuta de resolução proposta pelo CNJ.
A proposta do tribunal paulista deverá gerar reações. No final de agosto, evento no CNJ reuniu mulheres magistradas de todo o país para tratar do incentivo à participação feminina no Judiciário.
A relatora Salise Sanchotene deverá apresentar parecer do jurista Daniel Sarmento, professor titular de Direito Constitucional da UERJ, intitulado "Mulheres no Poder Judiciário e Discriminação de Gênero: criação de política de ação afirmativa para acesso de juízas aos tribunais de 2º grau como imperativo constitucional".
Ele entende que o CNJ detém competência para instituir, por ato normativo próprio, política para corrigir a grave assimetria entre os sexos na composição dos tribunais de segundo grau.
Sarmento cita decisão do STF no julgamento da ADC nº 12.
O CNJ já instituiu, por ato normativo primário, políticas de ação afirmativa em favor de pessoas negras e indígenas em concursos para a magistratura, Sarmento exemplifica.
"Por dever de coerência, o CNJ também deve instituir a medida de ação afirmativa, inclusive por já ter reconhecido a gravidade do problema da falta de equidade de gênero na composição dos tribunais de 2º grau", afirma o jurista.
Eis alguns trechos da nota técnica do TJ-SP:
- A proposta apresenta, em tese, vício de inconstitucionalidade. O CNJ ao propor significativa alteração dos critérios de promoção por antiguidade e por merecimento, estaria a desbordar do seu poder normativo, previsto no artigo 103-B § 4º, I, da Constituição.
- Ao se pretender a formação de lista apenas de juízas mulheres, ao lado de outra, mista, permite-se a promoção, frise-se, por antiguidade, de magistrado com menos tempo do que outro, ferindo frontalmente o critério constitucional.
- Na realidade, propõe-se a criação de terceiro critério, baseado na antiguidade apenas dos magistrados do sexo feminino.
- Não há como sustentar tenha o magistrado do sexo feminino, ao galgar promoção na carreira, maior merecimento do que o do sexo masculino e vice-versa.
- Além de distorcer os conceitos jurídicos de antiguidade e merecimento, tal inovação nos critérios a serem adotados na promoção dos magistrados extrapola os limites do poder normativo conferido pela Constituição Federal ao nobre Conselho.
- Eventual modificação, como intencionado pelo CNJ, não prescinde de modificação legislativa, não se podendo implementá-la por resolução do Conselho.
- Deve ser rechaçada com firmeza eventual prática que imponha obstáculo ou dificulte o acesso de mulheres aos Tribunais única e exclusivamente em razão do gênero. Bem diferente disso é estabelecer que, por ser mulher, a magistrada seja promovida antes de juiz também apto à promoção, que ingressou na magistratura passando por critérios de seleção rigorosamente iguais aos enfrentados por ela.
- É fato que ainda não há, em nosso tribunal, o mesmo número de desembargadores e desembargadoras. Entretanto, tal se dá, única e exclusivamente, por força da evolução histórica de nossa sociedade, e nunca por qualquer ato discriminatório desta Corte.
- No Estado de São Paulo, não há e nunca houve discriminação de gênero. Promove-se o mais antigo, seja homem, seja mulher.
- Em São Paulo, as primeiras mulheres ingressaram na magistratura em 22 de janeiro de 1981. Foram três, à época eram franca minoria. Mas, hoje, a situação é bem diferente. Por força do equilíbrio no ingresso de homens e mulheres, houve progressiva equalização do número de juízes e juízas em primeira instância, que conta atualmente, com 1.307 homens e 900 mulheres. As mulheres representam 40,78% da magistratura de primeiro grau. A paridade no segundo grau será obtida, em breve, de forma justa, igualitária e objetiva.
- Desde o ingresso na carreira, juízes e juízas sabem que concorrerão para promoção, nos critérios de antiguidade e de merecimento, em situação de absoluta igualdade. Não existem surpresas e isso permite o planejamento de uma vida.
- Inequívoca a aflição daquele que, depois de esperar por tanto tempo, poderá ter o sonho de atingir o mais alto grau no Poder Judiciário estadual sensivelmente mais distante.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.