Guia Negro

Afroturismo, cultura negra e movimentos

Guia Negro - Guilherme Soares Dias
Guilherme Soares Dias

Histórias com protagonismo negro começam a ser contadas

Só no mês de maio foram anunciados três museus com foco na negritude

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Guilherme Soares Dias

Foram quase 400 anos em que os negros eram tratados como mercadoria e animalizados no período da escravização. Outros 100 em que nossa história estava escanteada e sistematicamente apagada pelo racismo estrutural. Mas há uma mudança em curso. Poderia ser classificada de "silenciosa", mas o movimento negro se faz presente com seus gritos de ordem e tem mudado o rumo dessa narrativa.

As histórias negras começam, enfim, ser contadas como deveriam: com protagonismo. Só no mês de maio tivemos o anúncio de três museus com foco na negritude. Em Salvador, o Museu Nacional da Cultura Afrobrasileira (Muhcab) receberá R$ 15 milhões da prefeitura para conclusão do prédio e exposições.

No Rio, um museu sobre a diáspora africana deve ser construído até 2026, com investimentos do BNDES, na região do Cais do Valongo, porto que recebeu 1 milhão de pessoas escravizadas, o maior contingente nas Américas. O Cais do Valongo é tombado como patrimônio da humanidade e receberá, enfim, obras de valorização, com placas de sinalização, guarda-corpo e iluminação.

Cais do Valongo, que fica na região portuária do Rio de Janeiro, próximo a Pedra do Sal. (Foto: Eduardo Anizelli/ Folhapress, FSP-ESPECIAIS) ***EXCLUSIVO*** - Folhapress

Já em São Paulo, a Universidade Zumbi dos Palmares pretende transformar a antiga sede do Centro Paula Souza, no Bom Retiro, em Museu da História do Negro, com previsão de inauguração em 13 de maio de 2024. Todos os projetos ainda precisam de fato sair do papel, mas mostram uma mudança de rumo nas histórias contadas em museus, como já ocorreu no Museu da Imigração, em São Paulo, ou no Museu de Arte do Rio, o MAR.

Há ainda os territórios em disputa, como é o caso do Movimento Saracura Vai-Vai, no Bixiga, em São Paulo, que luta para mudar o nome da futura estação da Linha Laranja do Metrô para Saracura Vai-Vai (nome do quilombo e da escola samba que funcionaram na região). O movimento pede ainda que as peças oriundas do quilombo encontradas nas obras sejam expostas na futura estação de metrô, além de um projeto de educação patrimonial para disseminação da história.

Ainda na capital paulista, o Memorial dos Aflitos começa a ganhar corpo no Bairro da Liberdade lembrando o cemitério dedicado a pessoas negras e indígenas que esteve presente na região nos séculos 18 e 19. O projeto arquitetônico vencedor, no entanto, encontra resistência da comunidade e do movimento negro, por mostrar falta de entendimento da importância e das complexidades do local.

Em São Luís, o bairro da Liberdade, maior quilombo urbano das américas, ganhou placas sinalizadoras, com QR Code, nos espaços culturais de visitação e deve receber em breve uma central de informação turística da prefeitura. A iniciativa já reflete numa melhora na autoestima dos moradores, além de uma nova renda.

A capital maranhense acaba de viver seu auge, com as festas juninas, que incluem bumba meu boi, cacuriá e tambor de crioula, manifestações culturais da diáspora africana, tão ricas e tão pouco conhecidas fora de seu território. Mostra de que ainda vamos precisar descobrir e desejar vivenciar essas culturas negras.

Em Salvador, a festa de 200 anos da independência em 2 de julho, que garantiu o fim do domínio português no território brasileiro, teve mais visibilidade do que o costume na mídia nacional, com espaços de destaque em telejornais como Globo Repórter e Fantástico, da TV Globo.

Uma revolta popular liderada por mulheres como Maria Felipa, Joana Angélica e Maria Quitéria que contrapõe a narrativa do 7 de setembro de 1822, em que um homem branco gritou "independência ou morte" em terras paulistas, mas não garantiu a saída dos portugueses de todo o território brasileiro.

Ainda são muitos os passos, histórias, personagens, manifestações culturais e lugares com protagonismo negro que precisam ser contados. Mas o importante é que esse jogo começou a virar. Nós temos pressa de ver o povo preto em destaque e chegou a hora de cobrarmos essa dívida histórica. As narrativas negras são urgentes e todos nós queremos saber mais, experenciar e contar as histórias que não nos contaram.

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