Em vigor há pouco mais de dois anos, a lei "Nacer com Cariño" (Nascer com Carinho) tem alterado o cenário obstétrico de El Salvador, na América Central. Criada em agosto de 2021 pela primeira-dama do país, a psicóloga e educadora perinatal Gabriela de Bukele, a lei melhorou o atendimento de gestantes durante o pré-natal, parto e pós-parto.
No país onde nascem 70 mil bebês a cada ano, a redução da mortalidade neonatal já chegou a quase 50%. Segundo o Ministério da Saúde do país, o índice passou de 62,8 mortes a cada 100 mil nascidos vivos em 2021 para 34,5 mortes a cada 100 mil nascidos vivos em 2022.
A manobra de Kristeller (que empurra a barriga durante o parto), por exemplo, foi totalmente proibida e houve uma redução de 19,1% em 2021 para 8,6% até setembro de 2023 no número de episiotomias (corte entre o ânus e o períneo) realizadas no país.
As parturientes passaram a ter direito a um acompanhante, livre movimentação e a possibilidade de se alimentar e hidratar durante o nascimento dos filhos. Todas chegam bem informadas ao parto, e consequentemente, mais seguras. Isso também já refletiu na queda no número de cesáreas realizadas no país. Em 2021, o índice era de 22,3% e em 2022 caiu para 21,6%.
Todas essas mudanças estão retratadas no documentário "Todos Nascemos", de Eduardo Chauvet, que será lançado nesta quinta-feira (16), em São Paulo.
O diretor e roteirista da trilogia "Renascimento do Parto" traz agora relatos de profissionais de saúde e famílias que viveram experiências antes e depois da implementação dessa lei no país. Para isso, ele acompanhou diversos partos hospitalares em El Salvador durante todo o mês de fevereiro de 2023.
"Não precisamos investir milhões para humanizar os partos. Em El Salvador não fizeram nada de extraordinário. As mudanças vieram de ações simples, baseadas em evidência científica. É o invadir menos, agredir menos", pontua o cineasta.
"Muitos dizem que uma lei quando vem de cima pra baixo não funciona, mas lá houve uma conscientização e capacitação de todos os profissionais envolvidos. A adesão ocorreu de forma horizontal, com a presença de gestores de mudança", explica.
NASCER COM CARINHO
A lei assegura às mulheres um ambiente íntimo, descontraído e seguro para o parto, onde haja aconchego e a presença de um acompanhante em todo o tempo. As mulheres têm liberdade de movimentos e podem escolher a posição mais confortável durante o trabalho de parto. Além disso, podem consumir líquidos e alimentos para se manterem hidratadas e com energia.
A lei proíbe toques vaginais de rotina, tricotomia (lavagem intestinal), punções venosas desnecessárias, o rompimento da bolsa amniótica e prevê o corte tardio do cordão umbilical para prevenir anemia nos bebês.
"Para se ter uma ideia da violência obstétrica que o país vivia, há casos em que as famílias só tiveram o primeiro contato com o bebê oito dias após o nascimento", explica Chauvet.
Agora, com exceção dos casos em que o bebê precise de um atendimento médico urgente, o contato pele a pele com a mãe após o nascimento passa a ser obrigatório, assim como o alojamento conjunto, e a ampla proteção e o apoio à amamentação.
"O curioso é que aquilo que a gente briga para acontecer no Brasil, vai ao cartório, registra no plano de parto e ainda corre o risco de não ser atendido, lá agora é lei", pontua Chauvet.
ONDE VER?
O lançamento oficial de "Todos Nascemos" acontecerá em São Paulo, na quinta-feira (16), às 20h, no Espaço Itaú Augusta. Dia 20 de novembro, às 20h, o filme será exibido no Espaço Itaú Botafogo, no Rio, e no dia 22, em Brasília, também no Espaço Itaú.
Todas as exibições são gratuitas e serão seguidas de um debate com especialistas sobre como um modelo de assistência de El Salvador poderia ser aplicado aqui no Brasil e no mundo.
Para participar, basta enviar um email para todosnascemos@gmail.com, com nome completo, RG e CPF e a indicação da cidade onde gostaria de assistir. As vagas são limitadas.
Após a distribuição no Brasil, o documentário também será exibido em Buenos Aires, Milão e Los Angeles.
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