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Mensageiro Sideral - Salvador Nogueira
Salvador Nogueira

Nova medição de partícula pode ser revolução na física –ou não

Análise de resultados do acelerador Tevatron é incompatível com modelo padrão

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Uma nova medição de alta precisão da massa de uma partícula elementar pode abalar as estruturas do chamado modelo padrão, arcabouço teórico que explica como atuam e interagem todas as partículas conhecidas na natureza. Ou não.

O resultado, publicado na última edição da revista Science, diz respeito à massa do bóson W, uma das partículas portadoras da força nuclear fraca, ligada a certos processos de decaimento radioativo. Ele foi obtido pela colaboração internacional CDF (Detector Colisor no Fermilab), com base em análises de uma década de dados do acelerador Tevatron, que operou até 2011. De acordo com o grupo, a nova medida tem aproximadamente o dobro da precisão dos melhores esforços anteriores. E mostra um bóson W muito mais pesado do que o esperado. Muito mais, em física de partículas, é 0,1%.

Pode parecer mudança pequena e até fácil de acomodar. Afinal de contas, das três forças que o modelo padrão contempla com sucesso –a eletromagnética, portada pelo fóton, partícula de que é feita a luz; a força nuclear forte, portada pelo glúon, responsável pela aglutinação de prótons e nêutrons e pela estabilidade dos núcleos atômicos; e a força nuclear fraca, dos bósons Z e W, a dos decaimentos–, essa última parece ter ação bem restrita. Mas não é assim que a banda toca.

Imagem do acelerador de partículas Tevatron, perto de Chicago; máquina foi desativada em 2011
Imagem do acelerador de partículas Tevatron, perto de Chicago; máquina foi desativada em 2011 - France Presse

O modelo padrão, apesar de flexível (por exemplo, encaixando uma pequena massa para os neutrinos que, antes, supunha-se não terem massa), é um pouco como um castelo de cartas, e a partícula W, com a força nuclear fraca, está perto da base. Suas propriedades se encaixam na teoria com outros parâmetros observáveis, como a carga do elétron e a massa de outras partículas. Ou seja, se a massa do W for muito diferente, começa a faltar algum ingrediente para manter tudo mais que já foi exaustivamente medido em seu devido lugar.

Claro, isso é uma potencial discrepância que muitos físicos estão ansiosos por encontrar. Afinal, por mais completo que seja, sabemos que de fato faltam peças nesse grande arcabouço teórico – fora a gravidade, descrita pela relatividade geral e que se recusa a falar o idioma da mecânica quântica (a língua franca do modelo padrão), ainda falta explicar o que são as misteriosas matéria e energia escuras.

Porém, também não se pode ignorar que o modelo padrão vem funcionando como reloginho há décadas, antecipando descobertas e se tornando o mais bem-sucedido da história da física. Quanto mais consolidada é uma teoria, mais alto o sarrafo que um experimento precisa saltar para abalá-la. E joga contra o novo resultado o fato de que duas medidas anteriores, embora aparentemente menos precisas, casavam bonitinhas com o modelo padrão –e são incompatíveis com a novidade. Ou seja, precisaremos de futuras medições, ainda mais precisas (quem sabe vindas do LHC), para ver se há mesmo nova física vindo por aí.

Esta coluna é publicada às segundas-feiras, na Folha Corrida.

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