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Mensageiro Sideral - Salvador Nogueira
Salvador Nogueira
Descrição de chapéu astronomia

Estudo reduz chances de água líquida no presente de Marte

Experimentos demonstram que marcas no solo podem ser causadas por dióxido de carbono

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Em 2000, uma análise dos dados colhidos pela sonda Mars Global Surveyor, da Nasa, revelou a formação de certas marcas em encostas durante as estações mais quentes no planeta. Na ocasião, os cientistas concluíram que se tratava de água corrente no presente de Marte –uma descoberta extraordinária. Agora um estudo parece definitivamente jogar água no chope desse resultado. Ou melhor, dióxido de carbono.

Lonneke Roelofs, pesquisador da Universidade de Utrecht, na Holanda, liderou o trabalho que demonstra a não necessidade de água para explicar essas misteriosas marcas. As formações podem bem ser resultado da sublimação (passagem de gelo a gás) de dióxido de carbono represado no subsolo marciano.

No inverno daquele planeta, as temperaturas chegam a ficar abaixo de -120 graus Celsius, o suficiente para o congelamento do famoso CO2, principal componente da atmosfera marciana. Quando chega a primavera, esse gelo no subsolo se converte em gás de forma potente, em razão da baixa pressão atmosférica, o que empurra grãos de sedimentos e fazem o material fluir, formando os traços vistos nas imagens orbitais.

Imagem do Mars Global Surveyor revela vales na superfície de Marte
Imagem do Mars Global Surveyor revela vales na superfície de Marte - Nasa/France Presse

Essa na verdade não é uma ideia nova, e já havia sido proposta como uma explicação alternativa a fluxos de água corrente em Marte nos dias atuais –uma proposição por si só também complicada, dado que a maior parte da superfície marciana tem pressão atmosférica que impede a permanência de água em estado líquido, mesmo a temperaturas adequadas para isso. Imaginou-se que esses fluxos tivessem uma quantidade enorme de sais, capazes de permitir a liquefação, ainda que temporária.

A novidade do trabalho de Roelofs e seus colegas, publicado no periódico Communications Earth and Environment, do grupo Nature, é a realização de experimentos em uma "câmara marciana", capaz de simular em laboratório o ambiente do planeta, que permitiram ver o fenômeno acontecer diante de seus olhos. "Observamos que os detritos fluem guiados por gelo de CO2 em condições marcianas de forma tão eficiente quanto detritos fluem guiados por água na Terra", disse o líder da pesquisa.

Com isso, a expectativa de buscar água em estado líquido –e por tabela vida– no planeta vermelho acaba bastante reduzida. Mas não invalida a descoberta de que largas regiões do planeta preservam gelo de água em seu subsolo (feita tanto por detecções remotas como pela escavação direta da superfície feita pela sonda Phoenix, próxima ao polo norte marciano) e tampouco os resultados obtidos in-situ por diversos rovers da Nasa que indicam que Marte teve um passado de fato molhado. Há minerais em diversas regiões do planeta que trazem consigo evidências de que rochas tiveram contato direto com água, bilhões de anos atrás.

Como e por quanto tempo isso foi possível ainda é um mistério. Em tese, Marte deveria ter tido uma atmosfera mais densa no passado, capaz de gerar um efeito estufa mais poderoso que o deixasse mais quente, mas não há qualquer evidência que sugira que esse foi o caso. E, claro, como também não se sabe como a vida se origina e quanto tempo ela precisa para surgir, não se pode dizer se o processo poderia ter acontecido por lá como aconteceu por cá. Mais respostas sobre isso dependem de missões como as de retorno de amostras, atualmente em desenvolvimento por americanos, europeus e chineses.

Esta coluna é publicada às segundas-feiras na versão impressa, na Folha Corrida.

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