Volante campeão do mundo com a França na Copa de 1998, Patrick Vieira parou de jogar em 2011 e partiu, um tempo depois, para a carreira de treinador.
Vieira acreditou em seu potencial e decidiu meter as caras em um terreno avesso a gente como ele. Negros técnicos de futebol são exceção.
Tanto que ele é o único treinador negro entre os 20 empregados na Premier League, o campeonato inglês, que é a mais badalada competição nacional no mundo atualmente, tendo como técnicos mais famosos Pep Guardiola (Manchester City), Jürgen Klopp (LIverpool) e Antonio Conte (Tottenham).
Isso sendo que, do total de jogadores que disputam a Premier League, mais de quatro de cada dez (43%) são negros.
"Eu acredito que as portas não estão abertas para nós [treinadores negros] fazermos o que somos capazes e entrar na gestão", declarou Vieira à BBC. "Quando falo de gestão, falo da equipe e também de posições superiores."
Nas cinco principais ligas europeias (Inglaterra, Alemanha, Itália, Espanha e França), que juntas possuem 98 clubes, há somente dois técnicos negros: Vieira, 46, no Crystal Palace, e outro francês, Antoine Kombouaré, 58, no Nantes.
Só a Premier League tem o levantamento dos jogadores negros que a disputam, mas no "olhômetro" é fácil perceber que há dezenas deles defendendo os clubes em outros campeonatos, diferentemente do que se observa nas pranchetas.
Por exemplo, o Bayern de Munique, principal força do futebol alemão, tem no elenco Mané, Gnabry, Sané, Coman, Upamecano, Davies, Gravenberch e Sarr. Todos negros, comandados pelo branco Julien Nagelsmann.
O Napoli, líder do Italiano, conta em suas fileiras com Osimhen, Ndombelé, Zambo Anguissa e Juan Jesus. Todos negros, dirigidos pelo branco Luciano Spalletti.
No elenco do Real Madrid, atual campeão da Champions League e que ponteia o Espanhol, há Vini Jr., Alaba, Camavinga, Mendy, Éder Militão, Rüdiger e Tchouaméni. Todos negros. O técnico dos merengues é o branco Carlo Ancelotti.
O cenário se repete no Brasil, onde boa parte dos jogadores é negra ou parda.
Na elite do Campeonato Brasileiro, que tem 20 times, somente dois técnicos são negros: Jair Ventura (filho de Jairzinho, o Furacão da Copa de 1970), no Goiás, e Orlando Ribeiro, no Santos, este com status de interinidade.
Mesmo historicamente, são raros os técnicos que conseguiram trabalhar em grandes clubes no Brasil. Exceções recentes são Roger Machado (Grêmio, Palmeiras, Fluminense) e Marcão (Fluminense).
Mais para trás, Andrade (Flamengo), Cristóvão Borges (Fluminense, Vasco, Flamengo, Corinthians), Serginho Chulapa (Santos) e o falecido Lula Pereira (Flamengo, Bahia, Ceará).
"Precisamos dar oportunidades a pessoas de cor. Para podermos mostrar que somos tão bons como os demais", afirma Vieira, sendo não politicamente correto com ele mesmo ao citar "pessoas de cor".
O treinador, que não mencionou abertamente racismo para justificar o cenário por ele abordado –porém a conclusão óbvia é essa–, tem tido desempenho satisfatório no londrino Crystal Palace.
Com uma equipe sem craques e que não tem apoio financeiro gigantesco –diferentemente de Manchester City, Chelsea ou Newcastle–, ocupa a intermediária décima colocação na Premier League, com o mesmo número de pontos do badalado Liverpool.
Kombouaré, entretanto, tem sofrido para manter o Nantes fora da zona de rebaixamento no Francês, e tanto o Santos de Orlando Ribeiro como o Goiás de Jair Ventura fazem papel medíocre no Brasileiro –respectivamente 12º e 13º na tabela de classificação.
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Em tempo: Na Copa do Mundo do Qatar, que começa no dia 20 de novembro e terá 32 seleções, haverá três treinadores negros, todos de equipes da África negra. São eles Rigobert Song (Camarões), rival do Brasil na primeira fase, Otto Addo (Gana) e Aliou Cissé (Senegal).
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