Políticas e Justiça

Editado por Michael França, escrito por acadêmicos, gestores e formadores de opinião

Políticas e Justiça - Michael França
Michael França
Descrição de chapéu Vida Pública Enem Fies

Por um financiamento educacional mais equitativo

Um dos maiores trunfos da política educacional no Brasil é que ela não deixa de se reinventar

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Adriano Senkevics

É pesquisador do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) e doutor em educação pela USP (Universidade de São Paulo)

Um dos maiores trunfos da política educacional no Brasil é que ela não deixa de se reinventar, mesmo em se tratando de políticas consolidadas e já com larga tradição, caso do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação).

O Fundeb é um mecanismo de financiamento importantíssimo para a educação básica pública no Brasil. Ele é formado por uma combinação de recursos que vêm de impostos e transferências dos governos estaduais, municipais e do Distrito Federal, além de complementos financeiros da União.

Esse dinheiro é usado para apoiar a educação básica, considerando o número de estudantes matriculados em cada rede de ensino, com pesos distintos para etapas, modalidades e outros critérios.

Homem branco, de barca e óculos, tem cabelo tingido de loiro em foto em preto e branco
Adriano Senkevics é pesquisador do Inep e doutor em educação pela USP - Divulgação

A novidade é que, a partir de 2024, o nível socioeconômico (NSE) dos alunos passa a influenciar como esses recursos serão distribuídos, com o objetivo de ajudar ainda mais as áreas que recebem estudantes de maior vulnerabilidade social e econômica.

Essa proposta foi emendada à Constituição Federal pelos legisladores em 2020. Coube ao Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) a responsabilidade de tirar do papel tal inovação.

Para tanto, foram realizadas simulações, seguidas por análises de efeitos redistributivos, com o intuito de introduzir o NSE como um novo fator a ponderar a distribuição de recursos dos fundos às redes municipais e estaduais.

Tudo isso visando a uma melhor equalização dos repasses tomando por base não apenas o número e o tipo de matrícula, mas também os desafios de se escolarizar crianças e jovens de distintos contextos socioeconômicos.

O NSE, por sua vez, leva em conta um conjunto de medidas diretas e indiretas de renda domiciliar obtida a partir de questionários aplicados a estudantes, além de informações como o percentual de beneficiários do Programa Bolsa Família em cada escola.

Enquanto aguardamos a disponibilização dos dados mais recentes, nossas simulações apontam para efeitos promissores.

Os maiores beneficiários dessa política serão, justamente, os estados mais pobres da Federação: Maranhão, Alagoas e Ceará, por exemplo, observariam incrementos médios de mais de R$ 300 por aluno-ano, em relação a 2022.

Se olharmos para os 20 municípios que mais receberão recursos, estamos falando de ganhos da ordem de R$ 500 por aluno-ano. São municípios que enfrentam enormes dificuldades: em média, dois terços das suas populações encontram-se em situação de pobreza e quase a metade de seus estudantes de ensino médio estão defasados em relação à série que deveriam cursar.

Ademais, nenhuma unidade federativa teria, em média, perda de recursos. Mais de 4,5 mil municípios seriam beneficiados, em contraste a cerca de mil que deixariam de ganhar, porém, em magnitudes bastante inferiores aos ganhos das redes beneficiadas.

Isso porque o Fundeb é um mecanismo elegantemente complexo que, até 2026, observará aumentos da participação da União ano após ano. Assim, o papel supletivo desta acaba por compensar eventuais distorções.

Em vista disso, é notório que a ponderação de recursos por critérios socioeconômicos é uma inovação que condiz com os objetivos de garantia do desenvolvimento nacional e de redução das desigualdades.

Políticas sociais, por natureza, implicam decisões alocativas, as quais quase sempre acarretam redistribuição de recursos. Resta ter clareza dos sentidos que se pretende caminhar para se construir um país mais justo.

O editor, Michael França, pede para que cada participante do espaço "Políticas e Justiça" da Folha de S. Paulo sugira uma música aos leitores. Nesse texto, a escolhida por Adriano Senkevics foi "Lata d’Água", na voz de Elza Soares.

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