Um dos principais entroncamentos nos primórdios das ferrovias brasileiras, o complexo de Barra do Piraí (RJ) e a história de sua região são retratados num documentário lançado no último mês.
"Entroncamentos - Vida e Memória nas Estações Ferroviárias do Vale do Paraíba" mostra, a partir de depoimentos de personagens que viveram às margens da ferrovias, fotos e vídeos antigos o período de ascensão e declínio da ferrovia na cidade do Rio, que chegou a ter o maior entroncamento da América Latina.
Com entrevistas feitas na estação local, o documentário dirigido por Fernando Sousa e Gabriel Barbosa dá a dimensão dos estragos ocorridos no decorrer das décadas no sistema ferroviário fluminense.
O documentário estreou no festival internacional de Buenos Aires, em setembro, e estará em outros três festivais até novembro, entre eles um na Austrália.
O filme volta à década de 1850, quando a Estrada de Ferro Dom Pedro 2º, uma das primeiras do país, foi extremamente importante para o desenvolvimento da produção cafeeira e do próprio Vale do Paraíba.
Cidades surgiram às margens de seus trilhos, entre elas Barra do Piraí, onde Barbosa nasceu e cresceu.
Se, por um lado, o documentário exibiu o esplendor do sistema ferroviário, por outro traçou um panorama crítico do abandono gradual da ferrovia, a partir da memória de moradores e antigos ferroviários e especialistas.
Estações abandonadas, com pichações, sujeira, ausência de portas, janelas e telhado, são comuns na obra.
"Barra do Piraí sempre me marcou muito, como marca quem é morador da cidade e da região, por conta do entroncamento ferroviário. Quando comecei a trabalhar com cinema, foi o primeiro projeto que quis tocar", disse Barbosa.
A partir de um financiamento coletivo lançado em 2016, o filme começou a tomar corpo no ano seguinte e foi finalizado neste ano.
Primeiro longa da Quiprocó Filmes, "Entroncamentos" teve como objetivo dar um olhar local à história ferroviária, dialogando com a economia do café, responsável pelo desenvolvimento regional. O trabalho escravo do século 19 na cultura cafeeira também está presente na obra.
Assim como ocorreu em todo o sistema ferroviário brasileiro, o transporte de passageiros foi suprimido e aos usuários restou a saudade de embarcar nas estações da região fluminense.
"Trem de passageiros sempre foi um problema no sentido de não ter o investimento necessário para dar qualidade no transporte. O documentário mostra também como, no universo micro, essas pessoas que construíram suas vidas a partir da ferrovia e das estações foram impactadas, como essas pequenas cidades e estações foram impactadas."
O filme busca também explicações para como um lugar que teve o maior entroncamento ferroviário da época não se desenvolveu comparativamente a outras cidades beneficiadas com a ferrovia.
"O progresso, entre aspas, passou, foi embora e deixou seu rastro. Escutei tantas histórias das pessoas e vi tanta coisa bonita que foi construída, esperanças, e hoje tudo está em ruínas", disse o diretor.
Depois de fazer o circuito de festivais, Barbosa e Sousa planejam exibir o documentário em Barra do Piraí em 10 de março do ano que vem, dia em que a cidade celebra seu aniversário.
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