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Painel ajuda a compreender orçamentos das Universidades Federais

Corte orçamentário na era Bolsonaro é o maior das últimas décadas

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Maria Angélica Minhoto Soraya Smaili Pedro Arantes *Com a colaboração de Weber Tavares
São Paulo (SP)
Ilustração com um edifício envidraçado ao fundo, a imagem de um homem de barba grisalha e óculos com a legenda Professor Dr. Nelson Cardoso Amaral, à esquerda dele uma pessoa entre estantes de livros sob a legenda Biblioteca,, logo abaixo duas pessoas de braços abertos com um balão de fala fazendo uma pergunta relacionada a dinheiro, à direita um gari de uniforme verde claro com vassoura, pá e lata de lixo, à direita dele um eletricista em uma escada trocando uma lâmpada com um cifrão dentro, e no canto direito da imagem símbolos de torneira, eletricidade e dinheiro estão ligadas a um cano que desce para as seguintes legendas: Professores, Técnicos, Aposentados e Pensionistas.
Tácito Yuri Dutra Chimato/SoU_Ciência

A chamada "Ciência Aberta" ou "Open Science" traz benefícios para todo o "ecossistema" envolvido no processo de produção de ciência. Pesquisadores aumentam a visibilidade de seus trabalhos, a comunidade científica reduz custos operacionais, financiadores acompanham seus investimentos, e principalmente, a sociedade passa a ter mais acesso à ciência produzida.

O centro de estudos SoU_Ciência, sediado na UNIFESP, é um grupo de pesquisa multidisciplinar que adota a política da ciência aberta e pública, com transparência de dados em todas as pesquisas realizadas[i]. A missão do SoU_Ciência, como o próprio nome sugere, é fortalecer a conexão entre a Sociedade, a Universidade e a Ciência em favor do desenvolvimento de um Estado democrático, diverso, sustentável e solidário[ii]. Orientados por este propósito, sua equipe de pesquisadores relançou o Módulo I do painel de financiamento da Ciência e Tecnologia, que apresenta a série histórica com a execução do orçamento liquidado pelas Universidades Federais brasileiras nos últimos 23 anos[iii] (2000 a 2022) a partir de dados oficiais disponibilizados pela Secretaria de Orçamento e Finanças e corrigidos considerando a inflação medida pelo IPCA[iv].

Nesta quadra histórica, em que um deputado federal vinculado à extrema-direita, durante audiência da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, é capaz de afirmar que instituições federais de ensino superior são criadas para "formar mais imbecis[v]", conhecer a execução orçamentária das Universidades Federais permite, em alguma medida, avaliar o quanto o Estado Brasileiro valoriza (ou não) esta importante política pública. Conforme será apresentado a seguir, os dados demonstram o quanto o orçamento das Universidades Federais são vulneráveis às mudanças de governo que, embora típicas da democracia, deveriam preservar as políticas de Estado, em especial no Brasil, onde o Plano Nacional de Educação (PNE 2014/2024), aprovado por força da Lei 13.005/2014, estabeleceu que em 10 anos o Brasil deveria atingir:

· 50% de taxa bruta de matrícula em cursos de graduação (em 2022 ainda não havíamos chegado a 39%[vi]);

· 40% de participação do segmento público na expansão do ensino superior (em 2021, último dado disponível, a participação foi de 9,3%[vii])

Antes de apresentarmos alguns dos principais achados, é importante salientar que todo o material de pesquisa está disponível a partir do sitio eletrônico do SoU_Ciência, deste modo, para além de encontrar os dados sobre o orçamento de cada uma das 69 Universidades Federais, os usuários terão acesso a todo o background, incluindo: microdados; método de coleta de informações; metodologia empregada no processo de deflacionamento; análises sintéticas de cada informação; e Boletins analíticos que apresentam outras variáveis relacionadas ao objeto em análise.

Para facilitar o processo de pesquisa e, considerando as diferentes possibilidades de análise, o Módulo I "Orçamento das Universidades Federais" foi dividido em 04 grandes blocos:

· Investimento em infraestrutura e material permanente: São recursos aplicados na ampliação e melhoria da infraestrutura e dos bens à disposição da instituição, por exemplo: construção de prédios, aquisição de veículos, compra de equipamentos de laboratório e outros materiais permanentes;

· Despesas de manutenção e funcionamento: São recursos utilizados para garantir o funcionamento de rotina. Incluem-se desde o pagamento das despesas com água, energia elétrica e conexão à internet das unidades acadêmicas, passando pelo pagamento dos contratos com empresas de limpeza, vigilância e manutenção predial;

· Pessoal e Encargos Sociais: São recursos destinados ao pagamento dos salários dos servidores ativos (efetivos e temporários), dos aposentados e dos pensionistas;

· Assistência ao estudante: Recursos destinados prioritariamente a estudantes de baixa renda oriundos da rede pública de educação básica, matriculados em cursos de graduação presencial ofertados pelas IFES, por meio do fornecimento de alimentação, atendimento médico e odontológico, alojamento e transporte, dentre outras iniciativas típicas de assistência estudantil.

Investimento em infraestrutura e material permanente

Nos últimos anos, os gestores das Universidades Federais têm sido acusados de permitir o sucateamento das instituições. Ainda que possam existir exemplos esporádicos que denotem o uso pouco eficiente do recurso público, os dados levantados pela equipe do SoU_Ciência evidenciam que entre 2014 e 2022 houve uma redução de 87,9% nos recursos disponíveis para ações de investimento.

Conforme pode ser observado na Figura 01 a seguir, os valores liquidados pelas 69 Universidades Federais em 2022 são inferiores àqueles observados em 2002, quando possuíamos apenas 49 Universidades Federais.

Chama atenção o crescimento dos valores liquidados com ações de investimento entre 2008 e 2011, reflexo da instituição do Programa de Apoio aos Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais – REUNI, implementado por força do Decreto nº 6.096, de 24 de abril de 2007. No mesmo diapasão, entre 2012, 2013 e 2014, com particular intensidade neste último ano, o Governo Federal criou novas instituições e investiu em ações de reestruturação e expansão das Universidades Federais, conforme evidenciado na Figura 01. Os reflexos positivos desta política são comprovados por meio da ampliação do volume de matrículas das Universidades Federais.

Gráfico mostrando a variação no investimento em infraestrutura e patrimônio nas Universidades Federais no período de 2000 a 2022.
Figura 01 - Investimento em infraestrutura/patrimônio - Universidades Federais (2000 a 2022) - Fonte: SoU_Ciência

Despesas de manutenção e funcionamento

Por vincular-se ao pagamento dos gastos relacionados ao funcionamento das instituições, este grupo de despesas está fortemente associado ao volume de matrículas ofertadas na modalidade presencial. Segundo dados do Censo da Educação Superior produzido pelo INEP/MEC, entre 2000 e 2014 houve um aumento de 124,5% nas matriculas presenciais ofertadas pelas Universidades Federais[viii], neste período, a parte discricionária das despesas de manutenção e funcionamento cresceu 137,1%, ou seja, à medida que mais estudantes conseguiam acessar o ensino superior ofertado pelas Universidades Federais, mais recursos estavam à disposição das instituições para garantir seu funcionamento.

Entretanto, entre 2014 e 2021[ix], as matrículas presenciais registraram crescimento de 26,5% e neste mesmo período as despesas de manutenção e funcionamento das Universidades Federais sofreram uma redução de 52,02%, o que significa dizer que em 2021, apesar da ampliação do número de matrículas, as Universidades Federais possuíam menos da metade dos recursos liquidados em 2014.

Gráfico mostrando sespesas de manutenção e funcionamento em Universidades Federais no período de 2000 a 2022.
Figura 02 - Despesas de manutenção e funcionamento - Universidades Federais (2000 a 2022) - Fonte: SoU_Ciência

Reafirmamos o compromisso do SoU_Ciência com o rigor metodológico e com a transparência. Acreditamos que a única forma de transformar a educação em um direito de todos é fazendo com que a SOCIEDADE enxergue a UNIVERSIDADE PÚBLICA como um patrimônio do ESTADO BRASILEIRO, e que deve ser defendido por todos.

Por fim, convidamos os leitores a acessarem o Módulo I do painel de financiamento da Ciência e Tecnologia, disponível em: https://souciencia.unifesp.br/fctesp onde outros dados e análises estão disponíveis.

*Acompanhe mais informações sobre o Painel aqui no blog.

[i] https://souciencia.unifesp.br/sobre#apresentacao

[ii] https://souciencia.unifesp.br/sobre#missao

[iii] A escolha deste horizonte temporal está vinculada à disponibilidade de dados do Painel do Orçamento Federal disponível em: https://www1.siop.planejamento.gov.br/QvAJAXZfc/opendoc.htm?document=IAS%2FExecucao _Orcamentaria.qvw&host=QVS%40pqlk04&anonymous=true&sheet=SH06

[iv] https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/precos-e-custos/9256-indice-nacional-de-precos-ao-consumidor-amplo.html

[v] https://revistaforum.com.br/debates/2023/8/24/comisso-de-cincia-tecnologia-rebate-gustavo-gayer-por-chamar-universitarios-de-imbecis-142877.html

[vi] https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiNTZjNTY1NTUtODMxMi00OWJhLWE4ZjUtZjVlNjY1NDk3ZmIxIiwidCI6IjI2Zj czODk3LWM4YWMtNGIxZS05NzhmLWVhNGMwNzc0MzRiZiJ9

[vii] https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiNTZjNTY1NTUtODMxMi00OWJhLWE4ZjUtZjVlNjY1NDk3ZmIxIiwidCI6IjI2Zj czODk3LWM4YWMtNGIxZS05NzhmLWVhNGMwNzc0MzRiZiJ9

[viii] https://www.gov.br/inep/pt-br/areas-de-atuacao/pesquisas-estatisticas-e-indicadores/censo-da-educacao-superior

[ix] Último dado disponível do Censup quando da produção desta análise.

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