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Em defesa da FAPESP e da Ciência e Tecnologia

Retirada de recursos representa grande perda para o estado de São Paulo

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Lampada acessa sobre um fundo de papeis coloridos
Meyrele Nascimento/SoU_Ciência - Meyrele Nascimento/SoU_Ciência

Nas últimas semanas, o Brasil foi impactado pelas chuvas torrenciais ocorridas em quase todo o Rio Grande do Sul, levando a uma das maiores tragédias climáticas que temos conhecimento em nosso país e certamente a maior daquele estado. Escrevemos no Blog do SoU_Ciência um artigo, republicado na versão impressa da Folha de S. Paulo, sobre como a Ciência pode trazer compreensões e soluções para enfrentar as mudanças climáticas que já são realidade. Sabemos que precisaremos cada vez mais da Ciência e dos cientistas, que devem ser ouvidos, além das novas tecnologias capazes de reorganizar e adaptar a vida humana ao planeta em transformação.

Mas, hoje, infelizmente, queremos falar de outra catástrofe que está se anunciando e uma outra emergência que surge: a Lei de Diretrizes Orçamentárias de São Paulo, apresentada pelo governador Tarcísio de Freitas e que aponta para a retirada de 1/3 das verbas da FAPESP. Alguns poderão perguntar, mas o que é a FAPESP e por que isso é (ou se transformará em) uma emergência?

A FAPESP é a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, criada em 1960 (Lei Orgânica n. 5.918, de 18 de outubro de 1960), que começou a funcionar efetivamente em 1962 (Decreto n. 40.132, de 23 de maio de 1962). Mesmo antes de sua criação, a Constituição do Estado de São Paulo, de 1947, já havia estabelecido em seu Artigo 123 que "O amparo à pesquisa científica será propiciado pelo Estado, por intermédio de uma fundação organizada em moldes a serem estabelecidos por lei." Mais tarde, houve a definição de orçamento próprio para a Fundação, baseado na transferência de 0,5% do total da receita tributária do estado, o que posteriormente foi elevado para 1%, pela Constituição de 1989, em vigor.

Ao longo de todas essas décadas, a FAPESP passou por diversos governadores e gestões internas. Alguns governadores tentaram retirar recursos da Fundação, mas recuaram ao saberem de todos os feitos científicos e tecnológicos e do patrimônio imensurável que ela propicia para a sociedade. Nesse período, a FAPESP cresceu, aprimorou processos e tornou-se uma das principais, se não a principal, fundação de amparo à pesquisa dentre todas as 27 existentes, no Brasil. A garantia dos recursos com rigorosa prestação de contas possibilitou o fomento a pesquisas em todo o estado de São Paulo, em instituições públicas e privadas, apoiou a qualidade das pesquisas e dos pesquisadores e das pesquisadoras, apoiou e apoia parcerias com empresas, visando a transferência de tecnologia e a inovação tecnológica. Para a formação de mestres e doutores, e também para estágios de pós-doutorado, concedeu bolsas, auxiliou o intercâmbio internacional, a vinda de pesquisadores estrangeiros, que contribuíram para o crescimento da nossa pesquisa e pós-graduação, e promoveu a realização de congressos, simpósios e Escolas de Altos Estudos.

Trata-se de uma Fundação enxuta, que conta com dispositivos que não permitem gastar mais em sua administração, que é eficiente e gerida por especialistas altamente qualificados e diretamente comprometidos com as finalidades do desenvolvimento científico e tecnológico. A escolha de projetos é feita por um sistema sofisticado de análise por pares, que nada recebem para fazê-lo. Ao longo de sua história já fomentou 104.783 pesquisas e tem 4.178 projetos em andamento, concedeu 157.918 bolsas em um total de 284.764 programas em diversas áreas de atuação. São inúmeros projetos de pesquisa, de inovação, de aplicação, de parcerias com pequenas empresas, difusão e comunicação, como a Agência FAPESP, a Biblioteca Virtual (onde é possível pesquisar todos os projetos apoiados, assim como os acordos nacionais e internacionais e convênios), a Revista FAPESP, entre tantas outras ações de divulgação científica e comunicação com a sociedade.

Sim, a queda nos investimentos da FAPESP representará R$ 600 milhões a menos, o que significa deixar de investir em cerca de 1.300 projetos dos mais de 4.100 que se encontram em andamento, além de retirar cerca de 1/3 das 8.707 bolsas em vigência. Trata-se, portanto, de uma emergência, que afetará não apenas os estudos sobre mudanças climáticas, mas também os da área da Saúde, várias pequenas empresas e startups que trazem novas tecnologias, ou parcerias com a indústria, afetando inclusive o crescimento econômico do estado de São Paulo. Em seu artigo recente na Folha de S. Paulo, Horácio Lafer Piva, Pedro Passos e Pedro Wongtschowski, empresários de destaque, chamam a atenção para a ameaça à FAPESP, pois sabem o quanto isso afetará o próprio crescimento industrial.

A FAPESP é fundamental para diversas áreas e sempre esteve em linha com os principais problemas da atualidade. Desde o início da pandemia de covid-19, fomenta programas específicos que possibilitaram, e continuam possibilitando, às universidades e à ciência encontrar soluções para a enorme crise sanitária de nosso tempo, salvando vidas, como mostramos no Painel das Universidades em Defesa da Vida. Além disso, apoiou e apoia pesquisas desenvolvidas nos centros de pesquisas em Engenharia e nos Centros de Pesquisas Aplicadas, alguns deles também voltados para novos tratamentos de doenças incuráveis. Foi pioneira nas pesquisas sobre a biodiversidade e também em editais específicos para a transferência do conhecimento em programas de Políticas Públicas.

Há alguns anos, a FAPESP criou linhas de fomento e chamadas para os estudos sobre mudanças climáticas, antecipando as necessidades e a busca de soluções. Já são mais de 123 projetos concluídos e outros 33 estão em andamento. São inúmeros estudos que buscam métodos numéricos para modelos climáticos e de previsão do tempo, visando a resolução adequada das equações dos núcleos dinâmicos da atmosfera e do oceano: projetos de Ciência da Computação, engenharias de software, simulações, análise de dados e inteligência artificial para modelar e desenvolver sistemas e protocolos para preparação ou combate a desastres climáticos; pesquisas que auxiliam a agricultura e o cultivo com novas tecnologias que causem menor impacto nas mudanças climáticas, com o manejo eficiente de resíduos, visando o desenvolvimento sustentável; e outros estudos que visam a adaptação de sistemas de transporte nas grandes cidades, com soluções com base na própria natureza, que compreendem uma gama de soluções, propõem orientações e planejamento e o desenho de Políticas Públicas.

É preciso rever com urgência o Artigo 22 do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias enviado pelo governo Tarcísio de Freitas. A decisão acertada para o estado de São Paulo e sua população será a de continuar seguindo o que diz a Constituição Estadual, com a aplicação de 1% das receitas de impostos na FAPESP e, portanto, na Ciência, Tecnologia e Inovação. Nosso futuro está em jogo e o corte de orçamentos da FAPESP não comprometerá apenas as pesquisas, mas também todos os processos de desenvolvimento do estado de São Paulo.

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