Tinto ou Branco

Tudo que você sempre quis saber sobre vinho, mas tinha medo de perguntar

Tinto ou Branco - Tânia Nogueira
Tânia Nogueira
Descrição de chapéu Todas

Vinho sem caretice

Feira Naturebas reúne uma enorme diversidade de vinhos e públicos

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São Paulo

Preparem o fígado! Neste fim de semana (29 e 30), tem Naturebas, a maior feira dos vinhos naturais, orgânicos e biodinâmicos do Brasil. Mais de 180 produtores do Brasil e do mundo irão ocupar o andar térreo do pavilhão da Bienal no Ibirapuera. Vai ter muita coisa boa para provar. Apesar dos vinhos naturais serem famosos por dar menos ressaca, a tentação de ultrapassar todos os limites é grande.

O foco da feira são os pequenos produtores de vinho, mas o evento reúne também importadoras e produtores de outros produtos como queijos, azeites, charcutaria, pães e chocolates, além de outras bebidas. Quero muito, por exemplo, provar os refrigerantes naturais da Japi Bebidas Fermentadas, de Boissucanga, e os saquês naturais trazidos pela importadora Mega Sake. Vale muito a pena também provar os borbulhantes (espumante de frutas), vermutes e kombuchás da Companhia dos Fermentados, de São Paulo, e os destilados da Alba Destilaria, de Monte Belo do Sul.

mão segura taça com vinho
Feira Naturebas reúne em São Paulo 180 produtores de vinhos orgânicos, biodinâmicos e naturais - divulgação

É um show de diversidade. Há muito vinho que eu mesma nunca provei, como os da Azienda Agrícola Foradori, do Trentino, Itália, uma referência na produção de vinhos naturais no mundo. Tem também as mesas de importadoras das quais gosto muito e que sei que, certamente, trarão novidades. Alguns exemplos: de la Croix, Anima Vinum, Wines4U, Vinci, Berkmann, Winebrands, etc. No entanto, tem também alguns expositores que são amigos, velhos conhecidos ou mesmo pessoas que encontrei esses dias em degustações pré-feira. Então, no fim deste texto, deixo uma lista de sugestões de vinhos de que eu gosto para você provar na feira (ou fora dela).

Organizada pela nutricionista Lis Cereja, a Naturebas foi a primeira feira do Brasil dedicada a esse segmento. A primeira edição aconteceu em 2013 no restaurante de Lis, a Enoteca Saint VinSaint. Reuniu 20 produtores e atraiu cerca de 100 convidados. Este ano a previsão é de um público pagante 2500 pessoas. Fora os expositores e o pessoal de apoio, todos que estão ali são pagantes. A Naturebas não tem convidados. Sem exceção. Até jornalistas da área e sommeliers precisam comprar ingresso, ao contrário do que acontece na maior parte das feiras de vinho. "É uma feira sem fins lucrativos", diz Lis. " A gente não cobra nada dos produtores para participar e também não fica com nenhuma porcentagem das vendas". Segundo ela, todo dinheiro dos ingressos é usado para custear despesas. O preço do ingresso muda conforme vai chegando mais perto. Para domingo, ainda tinha no momento que fechei este texto. Sai por R$ 249,00, mais taxas, na plataforma online Ticket360.

Não foi só a feira que cresceu desde 2013. O consumo de vinho natural também. "Hoje o vinho natural está muito mais inserido no mercado da alta gastronomia", diz Lis. "Surgiram muitos produtores novos, tem muita gente falando sobre o tema, muitos bares de vinho natural abrindo, muitos restaurantes. Hoje em dia, existem até feiras que surgiram em paralelo à Naturebas para aproveitar a movimentação. Mas claro que a gente ainda é nicho. Os produtores naturais, orgânicos e biodinâmicos não são nem 10%, 90% ainda é convencional. Mas não é mais uma coisa underground, não é mais uma coisa alternativa. Está nas grandes rodas de discussão de todos os grandes degustadores, jornalistas e restaurantes do mundo".

Ainda assim, continua diferente. Principalmente, na atitude do público consumidor. Nada careta, nada empolado. Mas, afinal, o que é vinho natural? Qual a diferença entre ele e os orgânicos e biodinâmicos? Primeiro, é bom distinguir todos esses dos vinhos convencionais. Ou seja, a maioria dos vinhos que a gente toma por aí.

Lis Cereja despeja decanter de vinho na boca
Madrinha dos naturebas: Lis Cereja, dona da Enoteca Saint VinSaint, criou a feira de vinhos naturais em 2013 e persiste no trabalho de incentivar a produção de vinhos de modo mais natural - RODRIGO MONTINI/divulgação


Convencional - A grande maioria dos vinhos. Costuma ser produzido a partir de uvas cultivadas com o uso de fertilizantes e defensivos agrícolas, herbicidas e pesticidas, mas pode usar também uvas orgânicas ou biodinâmicas. O termo se refere mais ao método de vinificação. Nesse, o vinho convencional sofre várias interferências. A começar das leveduras responsáveis pela fermentação. Aqui, elas são adicionadas. É como pão com fermento de saquinho ou pão feito a partir do levain. Pode levar uma série de outros químicos.

Orgânico - Vinho feito de uvas orgânicas. Mas a vinificação não é muito diferente da convencional. Para o vinho ter o certificado de orgânico, ainda são permitidas uma série de interferências e o uso de vários produtos. A quantidade SO2 permitida é menor do que a do convencional. Há certificados diferentes nos diversos países.

Biodinâmico - Uvas de agricultura biodinâmica, usando técnicas criadas pelo filósofo austro-húngaro Rudolf Steiner, que também criou a medicina antroposófica e a pedagogia Waldorf. Segue uma série de regras e utiliza uma série de compostos naturais. Embora muita gente ainda acredite que agricultura biodinâmica não passe de crendice, costuma render vinhos de muita qualidade.

Natural - O termo se refere mais à vinificação do que ao cultivo das uvas. Na grande maioria das vezes, os produtores de vinho natural usam uvas orgânicas e biodinâmicas. Esse é o ideal, mas nem sempre a realidade.Pode também ser chamado de vinho de mínima intervenção porque o produtor busca interferir o mínimo possível na transformação do mosto em vinho. As leveduras são indígenas. Não se pode adicionar nenhum químico além do SO2. Os vinhos não costumam ser filtrados ou clarificados.
Não há certificação e nem leis que definam os vinhos naturais. Portanto, o conceito varia. Há quem aceite a filtragem e quem não, por exemplo. Costuma ter uma gama de aromas mais ampla. Costuma ser mais ácido e leve. "O vinho natural, na verdade, não é um tipo de vinho, mas sim um movimento", diz Lis. "Um movimento de resistência agrícola e cultural que surgiu contra a extrema industrialização do vinho na década de 1980, na França. "

Dez vinhos que você precisa tomar na Naturebas (ou depois dela)

1 - Montaneus Walk the Line Pinot/Gamay - Serra Gaúcha, Brasil. Semelhante a um passé tout grain da Borgonha, esse vinho mistura pinot noir e gamay. É leve, frutado, tem aquele toque de grafite dos cru de Beaujolais. Lançamento da vinícola, que está nas cartas dos melhores restaurantes do Brasil. Vinho de mínima intervenção a partir de uvas de cultivo sustentável. De R$ 172,80 por R$ 130,00 na Feira.

2 - Valparaíso Naturo Nebbiolo - Serra Gaúcha, Brasil. Esta é aquela vinícola de que falei no início de toda a tragédia do sul, aquela que encheu. Este vinho comprei naquele momento inicial da tragédia, porque eu estava curiosa para provar e também como uma forma de incentivá-los a continuar. É um clarete, com bastante aroma de frutas vermelhas e um leve floral. As uvas são plantadas sob cobertura plástica, o que permite um cultivo sem agrotóxicos. A vinificação é de mínima intervenção. De R$ 259,00 por R$ 190,00.

3 - Vinícola Pianegonda Mala Muchacha - Porto Alegre, Brasil. Este pinot noir eu ganhei quando fui conhecer a vinícola para fazer a reportagem sobre vinícolas urbanas de Porto Alegre. Já tomei. É bem gostoso. Tem um perfil, de início austero que, depois de um tempo com o vinho na taça, vai se abrindo, aparecendo aromas frutados e florais. Uvas de cultivo sustentável e vinificação de mínima intervenção. Custa R$ 160,00. Dois espumantes estarão em promoção, mas aqui só estou indicando vinhos que provei.

4 - Minca Chardonnay e Manzoni Bianco - Porto Alegre, Brasil. Pét-Nat da Cantina Mincarone com 36 meses sur lie, é um espumante untuoso, já com aromas de nozes e panificação, mais ainda fresco. A manzoni bianco, pouco conhecida no Brasil, é um cruzamento da riesling alemã com a pinot bianco. Preço promocional na feira: R$ 120,00. O produtor prefere não divulgar o preço fora da promoção porque, segundo ele, esse varia muito de acordo com o revendedor.

5 - Pheasant’s Tears Vardisperi Rkatsiteli - Kakheti, Geórgia. A Geórgia, considerada como berço da vinicultura, tem uma tradição de 8 mil anos na produção de vinhos. Seu terroir, com cordilheiras no Cáucaso e praias no Mar Negro, é bastante diverso. O país tem mais de 500 variedades de uva locais. Produzido por um americano que trabalha com o resgate de variedades esquecidas, este rosé é da uva vardisperi rkatsiteli. É fermentado de forma tradicional, na ânfora enterrada (qveri). É floral e levemente resinoso. Uvas biodinâmicas e vinificação de intervenção mínima. De R$ 322,00 (Europa Importadora) por R$ 290,00 .

6 - Jardín Oculto Negra Criolla - Vale de Cinti, Bolívia. A negra criolla é a mesma uva que no Chile recebe o nome de país. Uma uva patrimonial da América espanhola, muito adaptada na Bolívia. Em breve, sairá uma matéria minha sobre os vinhos deste país. Para fazê-la, provei este delicioso tinto, muito fresco, leve, mas estruturado. As uvas crescem como trepadeiras em árvores e a vinificação é de mínima intervenção. De R$ 395,00 (La Gruta Importadora) por R$ 349,00

7 - Morgado do Quintão Ânfora Branco - Algarve, Portugal. A crato branco (100%) é uma uva autóctone de Portugal, prima da síria. Apesar de fermentado em ânforas, este vinho é claro e límpido. No nariz, é limpo e elegante. Na boca, tem muita mineralidade. As uvas têm certificado de orgânicas e a vinificação é de mínima intervenção. De R$ 590,00 (Caves Santa Cruz) por R$ 434,00.

8 - Florisa Cupuaçu - Acre, Brasil. Este fermentado de cupuaçu, por lei, não pode ser chamado de vinho, mas, na real, é um delicioso vinho branco. Um vinho do Acre! Quer respeitar mais o terroir do que isso. É claro, límpido. Tem aroma de cupuaçu, mas também de abacaxi, pêssego e cítricos. Na boca, é seco e tem ótima acidez. Muito gostoso. O cupuaçu é nativo floresta, fruto de extrativismo. De R$ 150,00 (Família Kogan Wines) por R$ 110,00.

9 - Textura Pretexto Palhete - Dão, Portugal.O palhete é um tipo (classificação) de vinho que só existe em Portugal. Pela cor, transparência e frescor, pode ser confundido com o clarete. Mas, não. Palhete é o termo usado para vinhos feitos a partir da fermentação conjunta de uvas brancas e tintas. A Textura Wines é um projeto de um casal de brasileiros no Dão. Provei na Vinhos de Portugal. Chamou minha atenção pelo frescor e elegância. As uvas são orgânicas certificadas e a vinificação, de intervenção mínima. De R$ 320,00 (011 Vinhos Naturais) por R$ 250,00.

10 - Vinas Mora Kaamen III - Primosten, Croácia. Produzido em cima da pedra, literalmente, e ao lado do mar, esse tinto claro da uva autóctone babic tem boa acidez, uma certa rugosidade fina e é bastante seco. Chega a ser salgadinho. Tanto que no almoço em que eu o provei, na comemoração dos 20 anos do restaurante Pobre Juan, o produtor fez questão que a carne feita para harmonizar com ele tivesse algo de peixe. No caso, um molho de anchovas. As uvas são orgânicas e a vinificação, de intervenção mínima. De R$ 750,00 (Uva Vinhos) por R$ 600,00.

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