Esqueletos de morcego mais antigos conhecidos lançam luz sobre a evolução dos mamíferos voadores

Fósseis de 52 milhões de anos mostram que no início de sua história os morcegos já possuíam muitas das características vistas nas espécies modernas

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Will Dunham
Washington | Reuters

Os dois esqueletos fósseis de morcego mais antigos dos quais se tem conhecimento, encontrados no sudoeste do Wyoming (EUA) e datando de pelo menos 52 milhões de anos atrás, estão trazendo insights sobre a evolução inicial desses mamíferos voadores, representados hoje por mais de 1.400 espécies.

Descritos em um estudo novo, os fósseis são de uma espécie previamente desconhecida chamada Icaronycteris gunnelli. Ela é estreitamente aparentada com duas outras espécies conhecidas graças a fósseis um pouco mais recentes da mesma área, que durante a época eocena era um ecossistema subtropical úmido tendo ao centro um lago de água doce.

"Esse morcego não diferia muito dos morcegos insetívoros de hoje", disse o paleontólogo Tim Rietbergen, do Centro Naturalis de Biodiversidade, na Holanda, e autor principal do estudo publicado esta semana no periódico científico Plos One.

Fóssil de esqueleto encontrado em Wyoming, nos EUA, identificado como da espécie Icaronycteris gunnelli
Fóssil de esqueleto encontrado em Wyoming, nos EUA, identificado como da espécie Icaronycteris gunnelli - Mick Ellison/Museu Americano de História Natural/via Reuters

"Se ele dobrasse as asas junto ao corpo, caberia facilmente na minha mão. Suas asas eram relativamente curtas e largas, refletindo um estilo de voo mais esvoaçante. Sua dentição mostra claramente que era um morcego que comia insetos. E é muito provável que fosse um morcego ecolocalizador." A ecolocalização é uma forma de sonar comum em morcegos, que a usam para se orientar e caçar.

Os dentes do morcego possuíam cúspides e arestas afiadas, próprias para cortar o exoesqueleto de insetos, e não tinham as superfícies arredondadas, próprias para amassar alimentos, que são úteis para comer frutas.

O que chama a atenção nos dois fósseis —um deles descoberto em 2017 e o outro desenterrado originalmente em 1994, mas apenas agora reconhecido como sendo uma espécie nova— é como eles mostram que no início de sua história os morcegos já possuíam muitas das características vistas nas espécies modernas.

"Os morcegos parecem morcegos desde a primeira vez que aparecem no registro fóssil como esqueletos completos. Não temos nada do qual se possa dizer que parece ‘metade morcego’ —ou seja, não temos bons fósseis transicionais", comentou o paleontólogo Matt Jones, da Arizona State University, coautor do estudo.

"O Icaronycteris gunnelli é um pouco diferente dos morcegos modernos —tem pernas mais longas e a extensão dos ossos de seus braços é um pouco diferente. O mais notável é que ele ainda preservava uma garra em seu dedo indicador. Algumas poucas outras espécies fósseis daquela época ainda tinham essa garra, mas ela não está mais presente na maioria dos morcegos vivos", acrescentou Jones.

Essa espécie foi estreitamente aparentada com duas outras espécies de morcegos cujos fósseis foram encontrados anteriormente no mesmo local: o Icaronycteris index e o Onychonycteris finneyi. Isso indica que na fase inicial da história dos morcegos havia uma diversidade maior de espécies do que se pensava previamente.

Os fósseis representam os esqueletos de morcego mais antigos dos quais se tem conhecimento. Ambos são muito completos e bem preservados. Os únicos fósseis de morcego mais antigos são dentes isolados e fragmentos de maxilar encontrados em lugares incluindo Portugal e China e datando de cerca de 55 milhões ou 56 milhões de anos atrás.

"A história evolutiva inicial dos morcegos é obscura, e há muitas perguntas para as quais não temos respostas", disse Rietbergen.

O fato de que esses espécimes de esqueletos mais antigos conhecidos são claramente de morcegos completamente formados sugere que os primeiros morcegos teriam surgido milhões de anos antes disso.

A história evolutiva inicial dos morcegos é obscura, e há muitas perguntas para as quais não temos respostas

Tim Rietbergen

Paleontólogo do Centro Naturalis de Biodiversidade

"Eles provavelmente evoluíram durante a época paleocena, o intervalo de 10 milhões de anos entre o fim da era mesozoica e a época eocena", disse Jones, descrevendo um tempo de experimentação evolutiva incrível, quando os mamíferos se tornaram os animais terrestres dominantes, após o impacto de asteroide que levou à extinção dos dinossauros, 66 milhões de anos atrás.

Apenas dois outros grupos vertebrados conseguiram voar: os répteis voadores conhecidos como pterossauros e as aves, ambos os quais surgiram antes dos morcegos. O asteroide exterminou os pterossauros.

Cientistas ainda estão tentando determinar que mamíferos foram os ancestrais dos morcegos.

"Pensamos que os morcegos provavelmente evoluíram de um mamífero insetívoro pequeno e arborícola", disse Jones. "Mas há uma série de insetívoros fósseis enigmáticos mais ou menos da época em que os morcegos devem ter surgido, e não está claro se algum deles tem parentesco com os morcegos, e, se sim, qual deles."

Tradução de Clara Allain

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