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Análise de DNA revela traços genéticos de síndrome de Down em ossos antigos de bebês

Descoberta pode ajudar a esclarecer como no passado sociedades tratavam crianças com condições raras

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Carl Zimmer
The New York Times

Cientistas identificaram traços genéticos de síndrome de Down nos ossos de sete bebês —um dos corpos tem 5.500 anos de idade. O método adotado no estudo, publicado no último dia 20 na revista Nature Communications, pode ajudar pesquisadores a aprender mais sobre como sociedades pré-históricas tratavam pessoas com essa e outras condições.

A síndrome de Down, que hoje ocorre em média em 1 a cada 700 bebês, é causada por uma cópia extra do cromossomo 21. Esta, por sua vez, produz proteínas extras, o que pode implicar uma série de alterações, incluindo defeitos cardíacos e deficiências de aprendizado.

Restos de ossos
Ossos de feto com síndrome de Down no sítio de Las Eretas, em Navarra, na Espanha - Government of Navarre and J.L. Larrion via The New York Times

Os cientistas vêm tentando há anos entender a história da condição.

Hoje, mulheres que viram mães mais velhas apresentam maior probabilidade de ter um filho com Down. Mas, no passado, mulheres tinham maior probabilidade de morrerem mais jovens, o que pode ter tornado a síndrome mais rara. Além disso, crianças que nasciam com a condição provavelmente tinham menos chances de sobreviver sem uma cirurgia cardíaca e outros tratamentos que surgiram e prolongam suas vidas.

Arqueólogos podem identificar algumas condições raras, como nanismo, apenas com base em análise dos ossos. Porém, a síndrome de Down é diferente. Pessoas com a condição podem ter diferentes combinações de sintomas e apresentar formas mais graves ou mais leves.

Com isso, é difícil diagnosticar com confiança esqueletos antigos de pessoas com síndrome de Down. "Você não pode dizer: 'Ah, essa mudança está aqui, então é trissomia do 21'", disse Julia Gresky, antropóloga do Instituto Arqueológico Alemão, em Berlim, que não esteve envolvida no novo estudo.

Nos últimos anos, os geneticistas têm testado métodos no DNA preservado em ossos antigos. No entanto, a tarefa se mostrou desafiadora porque os cientistas não podem simplesmente contar cromossomos completos, que se desintegram em fragmentos após a morte.

Em 2020, a geneticista Lara Cassidy, então no Trinity College Dublin, e seus colegas usaram DNA antigo pela primeira vez para diagnosticar um bebê com síndrome de Down. Eles estavam examinando genes de esqueletos enterrados em uma tumba de 5.500 anos no oeste da Irlanda. Os ossos de um menino de seis meses continham quantidades altas de DNA do cromossomo 21.

Desde então, o estatístico Adam Rohrlach, à época no Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva em Leipzig, Alemanha, e seus colegas desenvolveram um método para encontrar a assinatura genética. O processo por ser utilizado para examinar rapidamente milhares de ossos.

Rohrlach teve a ideia quando conversou com um cientista do instituto sobre procedimentos para procurar DNA antigo. Como a sequenciação de DNA de alta qualidade é muito cara, descobriu-se que os pesquisadores estavam analisando ossos com um teste mais barato —chamado sequenciamento Shotgun— antes de selecionar alguns para investigação adicional.

Se o osso ainda preservasse DNA, o teste revelava pequenos fragmentos genéticos. Muitas vezes, esses fragmentos vinham de micróbios que crescem nos ossos após a morte. Alguns ossos, porém, também continham DNA humano, e aqueles com uma porcentagem alta eram sinalizados para testes adicionais.

O estatístico descobriu que o instituto havia examinado quase 10 mil ossos humanos dessa maneira, e os resultados de todo o sequenciamento Shotgun estavam armazenados em um banco de dados. Ocorreu a Rohrlach e seus colegas que eles poderiam escanear o banco de dados em busca de cromossomos extras.

"Pensamos: 'Ninguém nunca verificou esses tipos de coisas'", disse Rohrlach.

Ele e seus colegas escreveram um programa que classificou os fragmentos do DNA recuperado por cromossomo. O programa comparou o DNA de cada osso com o conjunto inteiro de amostras. Em seguida, identificou ossos específicos com um número incomum de sequências provenientes de um cromossomo específico.

Dois dias após a conversa inicial, vieram os resultados. "Aconteceu que nosso pressentimento estava certo", disse Rohrlach, hoje professor associado na Universidade de Adelaide, na Austrália.

Eles descobriram que a coleção do instituto incluía seis ossos com DNA extra do cromossomo 21 —a assinatura da síndrome de Down. Três pertenciam a bebês de até um ano e os outros três a fetos que morreram antes do nascimento.

O docente também fez um acompanhamento do estudo de 2020 de Cassidy. Ele usou seu programa para analisar o sequenciamento Shotgun do esqueleto irlandês e descobriu que também havia um cromossomo 21 extra, confirmando seu diagnóstico inicial.

Além disso, ele encontrou outro esqueleto com uma cópia extra do cromossomo 18. Essa mutação causa uma condição chamada síndrome de Edwards, que geralmente leva à morte antes do nascimento. Os ossos eram de um feto que morreu com 40 semanas e estavam gravemente deformados.

A nova pesquisa não permite a Rohrlach e a seus colegas determinarem quão comum era a síndrome de Down no passado. Muitas crianças com a condição provavelmente morreram antes da idade adulta, e os ossos frágeis das crianças são menos propensos a serem preservados.

Segundo o professor, é significativo que três crianças com síndrome de Down e uma com síndrome de Edwards tenham sido enterradas em duas cidades vizinhas no norte da Espanha entre 2.800 e 2.400 anos atrás.

Normalmente, as pessoas nessa cultura eram cremadas após a morte. Essas crianças, porém, foram enterradas dentro de construções, às vezes com joias. "Eram bebês especiais que estavam sendo enterrados nessas casas, por razões que ainda não entendemos", afirmou o estatístico.

Gresky não encontrou evidência que tornasse possível descartar a possibilidade de acaso para o agrupamento de casos.

"Talvez os ossos estivessem bem preservados", disse ela. "Talvez os arqueólogos fossem tão bons e bem treinados que retiraram todos eles. Talvez tenham sido enterrados de uma maneira que tornou muito mais fácil encontrá-los."

Ainda assim, a antropóloga considerou o novo estudo um avanço importante. Por exemplo, pode permitir que os arqueólogos comparem restos geneticamente identificados com síndrome de Down e descubram algum conjunto oculto de características comuns a todos os seus esqueletos.

E Gresky espera que outros pesquisadores usem o DNA antigo para iluminar as histórias ocultas de outras doenças raras. "Você só precisa procurá-las e falar sobre elas", disse Gresky. "Caso contrário, elas permanecerão invisíveis."

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