É tanta morte e tanta falta —de leitos, de medicamentos, de oxigênio e até de covas para jazer os corpos dos que perderam a vida— que no Brasil tem gente lamentando não ser idoso para poder se vacinar contra a Covid-19 o quanto antes. O medo da infecção e a ansiedade são tão grandes que há pessoas invejando aqueles que possuem idade suficiente para se enquadrarem nos critérios de prioridade de vacinação estabelecidos: depois dos profissionais da saúde, os idosos.
É isso mesmo. Num cenário de descontrole da pandemia, a maioria já está convencida de que não há como superar a crise sanitária sem tomar a vacina. E, apesar dos detratores, a vacina se mostrou poderosa a ponto de motivar um fenômeno improvável no Brasil pré-coronavírus: o despertar da valorização da longevidade.
Envelhecer tem suas peculiaridades, como o surgimento de enfermidades. Mesmo quem tem a felicidade de manter a saúde, não escapa da perda funcional. Porém é inegável que há coisas que só se adquire com o tempo. Contudo até o que deveria ser reverenciado e valorizado, em geral costuma ser negligenciado pela sociedade brasileira.
Pois durante a pandemia há quem esteja triste por não ser mais velho do que é. Mesmo que seja uma tristeza da boca pra fora. Dia desses ouvindo conversa na fila do supermercado —uma das poucas atividades que tenho feito fora de casa— a mulher à minha frente declarou: “Queria ter feito 70 e não 45 anos para poder me vacinar de uma vez”.
Surpreendente, não?
Tenho um amigo carioca que vivia reclamando do avanço da idade, mas este ano comemorou feito doido o fato de o aniversário ter coincidido com o calendário de vacinação na cidade. Nem bem o dia raiou e lá estava ele em frente à unidade de saúde, braços a postos. Voltou para casa feliz da vida com a primeira dose da Coronavac e está contando os dias para completar a imunização. Tomara que a valorização da longevidade sobreviva à pandemia no Brasil.
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