Nada é tão ruim que não possa piorar. O dito popular parece aplicar-se à perfeição à situação da população negra brasileira durante a pandemia de Covid-19. Além de toda a série de mazelas que tem provocado em nível nacional, o coronavírus está aniquilando vidas negras.
Boletim de análise temática lançado pelo Ipea sobre os efeitos étnico-raciais da pandemia no país confirma que o impacto do coronavírus é ainda mais devastador nas periferias, onde vivem os mais pobres e mais vulneráveis, refletindo-se de maneira díspar sobre os negros.
Um dos artigos do estudo —intitulado A Cor da Moradia: apontamentos sobre raça, habitação e pandemia, assinado por Ernesto Galindo e Jorge Pedreira Jr.— aponta “vulnerabilidades que levam a desigualdades que se perpetuam em todas as dimensões”. Os autores apresentam um dado tão aterrorizante que tomo a liberdade de reproduzir a seguir:
“O Atlas da Violência do Ipea de 2020 indica, para 2018, que 75,7% das 58 mil mortes por homicídio foram de vítimas negras (contra 51% da distribuição dos negros na população). A Covid-19 tirou o dobro de vidas das mortes por homicídio de um ano inteiro na metade do tempo, levando a óbito mais negros de Covid-19 até agora que o total de homicídios de todas as raças/cores no período de um ano.”
No Rio de Janeiro, o Painel Unificador Covid-19 nas favelas, que desde julho reúne dados sobre o impacto da pandemia em 227 comunidades fluminenses, já havia sinalizado a tendência de alta de óbitos entre os mais pobres.
No sábado, a Folha noticiou um estudo sobre as mortes de pessoas negras em São Paulo durante a pandemia. Por conta da Covid-19, o aumento dos óbitos foi de 25,1% entre negros em 2020. Entre os brancos, as mortes aumentaram 11,5%. A situação consegue ser ainda mais dramática entre os jovens. Nesse caso, a disparidade entre as mortes de negros e não negros chega a ser quatro vezes maior entre pessoas de até 29 anos. É a pandemia da pandemia.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.