Nascido em Burkina Faso, na África, o arquiteto e ativista social Francis Kéré cresceu sabendo que o que importa são as pessoas e que a educação transforma. Talentoso, converteu essa percepção em projetos arquitetônicos sustentáveis, contemporâneos e compromissados com a justiça social. Foi assim que há seis dias ele se tornou a primeira pessoa negra a conquistar o prêmio Pritzker, considerado o Nobel da arquitetura.
Reconhecido mundialmente por "empoderar e transformar" comunidades carentes, foi descrito no comunicado oficial do Pritzker como alguém que "trabalha para melhorar as vidas e experiências de inúmeros cidadãos (...)". Além da África, Kéré tem obras na Dinamarca, Alemanha, Itália, Suíça, Reino Unido e EUA.
Nada mal para o filho do chefe de uma aldeia na qual foi o primeiro a frequentar a escola. Aos 19 anos, com uma bolsa de estudos de carpintaria, mudou-se para Berlim, onde aprendeu a fazer telhados e móveis durante o dia, e frequentava aulas à noite. Outra bolsa, desta vez na prestigiada Technische Universität Berlin, garantiu a graduação. "Temos de lutar para criar a qualidade que precisamos para melhorar a vida das pessoas", diz Francis Kéré.
Para quem vive no Brasil, onde o déficit habitacional é estimado em cerca de 6 milhões de unidades, o raciocínio do arquiteto também parece digno de premiação. Sobretudo considerando-se que condições precárias de moradia podem ser determinantes para abreviar vidas.
Nesse contexto, não deixa de ser uma triste ironia que o anúncio de Kéré como vencedor do Pritzker por "seu compromisso com a justiça social e o uso inteligente de materiais locais para responder ao clima natural" tenha ocorrido no dia 15, data em que se completava um mês da tragédia que matou pelo menos 233 pessoas em Petrópolis, a maioria pobre, muitas pretas e pardas, afogadas ou soterradas na lama por viverem em áreas de risco, sem planejamento urbano ou atenção à sustentabilidade
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