Angela Alonso

Professora de sociologia da USP e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento

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Angela Alonso
Descrição de chapéu Eleições 2022

Elas por elas

O urgente, manter ou perder a democracia, ofuscou o relevante, a igualdade entre homens e mulheres

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"Vaca vota em vaca", opinião de um membro do rebanho bolsonarista, o coronel Ricardo Sant’Anna. Mulher que incomoda vira um bicho –vaca, galinha—, quando agrada, vira outro —coelhinha, gata.

Na eleição passada, quem aderiu à campanha "Ele Não", puxada pelo movimento feminista, virou cadela no vocabulário inimigo. A mulherada bolsominion, que se julga de outra espécie, reagiu com o "Ele Sim".

Cada quadrado deu um papel para mulher na política. As donas da própria carreira, do seu corpo e da sua vida, falavam por si mesmas. Gente como Manuela d'Ávila, então vice de Fernando Haddad. As maquiadas, bem-comportadas, religiosas, representavam a família, sem embaçar o brilho dos maridos. Caso de Damares Alves, depois ministra de Bolsonaro.

A senadora e candidata à Presidência Simone Tebet e sua candidata a vice Mara Gabrilli - Zanone Fraissat - 2.jul.22/Folhapress

Esses padrões de política feminina, tão vívidos em 2018, não gestaram candidaturas presidenciais em 2022. Um primeiro turno informal, ao longo da definição das chapas, afunilou a corrida. Há, de fato, a frente anti-Bolsonaro e o extremismo presidencial, opostas em quase tudo, menos na composição masculina.

Candidatas, só três, todas sem viabilidade. A dobradinha Simone Tebet-Mara Gabrilli, ao centro, carece das alianças que poderiam catapultá-la. As de Vera Lúcia e Sofia Manzano, no canto esquerdíssimo do espectro, são apenas simbólicas.

No páreo mesmo, nada de saia. Nem na cabeça, nem como vice. As mulheres ocupam lugar subsidiário nas campanhas, como as esposas Janja, de estilo moderno, e Michele, à maneira de pastora.

O quadro se replica em quase todas as disputas estaduais. A inclusão, quando ocorre, é subordinada, caso do par de Haddad, que é cônjuge de um aliado. Raras mulheres concorrem no jogo principal. São 34 correndo para governos, longe dos 200 candidatos, conforme levantamento de O Globo.

A cota feminina de fato é, assim, de 17%. As com chances são somente três: Marília Arraes, em Pernambuco, Teresa Surita, em Roraima e Fátima Bezerra, no Rio Grande do Norte. São Paulo, que se acha tão moderno, nunca teve governadora. Na história da República, apenas oito senhoras governaram estados.

A eleição de uma presidenta não impactou a lógica masculina do sistema político. Mesmo com cota para participação feminina, o efeito é acanhado e as fraudes, avultadas.

Soma-se a baixa solidariedade de gênero. As intenções de voto de Vera Lúcia, Sofia Manzano e Simone Tebet são mais altas entre as eleitoras, mas, juntas, ficam abaixo dos 5% do eleitorado. Mesmo politicamente tão distintas, pontuam igualmente mal. É que não é questão de direita e esquerda, é de gênero. Dilma foi a exceção de uma regra. Exceção impichada.

O apoio às candidatas é minúsculo, longe até do terceiro colocado, que, aliás, só arrumou uma vice depois de malograr nas alianças fora do partido.

Gênero aparece e desaparece na campanha. O urgente, manter —ou perder— a democracia, ofuscou o relevante, a igualdade entre homens e mulheres.

A urgência, contudo, é para o executivo federal. A eleição de mulheres poderia ter motivado uma campanha legislativa nacional, mas não se vislumbra nenhuma iniciativa de monta.

O problema está à vista, por isso, os homens fazem um gesto aqui, outro acolá. De concreto mesmo, quase nada. As tratadas como gatas, como as tidas por vacas, ficam no segundo plano ou com posto de segunda.

Vai eleição, vem eleição e segue sempre elas por elas.

A colunista se ausenta e volta em setembro

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