Angela Alonso

Professora de sociologia da USP e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento

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Angela Alonso

Resumo de junho

O aniversário de 2013 é lembrete de que a esquerda não é mais a senhora dos protestos

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O aniversário acabou, hora da conta da festa. Junho de 2013 completou 10 anos. De presente, matérias, especiais, entrevistas. O tratamento ao rapazinho ecoou o dispensado quando era recém-nascido.

No parto, ganhou quatro nomes. Um foi "jornadas", em honra a maio de 1968 e à Comuna de Paris, que o afiliou à linhagem da "nova esquerda". Outros padrinhos o batizaram com a tese das expectativas crescentes: satisfeitas as condições de vida, as demandas de rua seriam por qualidade de vida (na síntese lulista: "o povo já tem pão, agora quer manteiga"). Terceira alcunha foi "crise de representação": o protesto seria antissistêmico, de crítica às instituições políticas. E houve quem falasse em sequestro: parida na esquerda, a mobilização teria sido tomada pela direita.

Essas interpretações ressurgiram com a efeméride. Todas tomam os protestos como monolíticos e unidirecionais.

Em minha pesquisa, achei outra coisa e adotei outro nome: ciclo de protesto. Ciclos são momentos de manifestação simultânea de muitos movimentos. Foi o que aconteceu em junho, quando a rua foi tomada por um mosaico de movimentos com agendas e propósitos distintos entre si.

Movimentos que cresceram lentamente, em protestos avulsos e pequenos, desde a chegada do PT ao poder. Muitos e variados, mas divisíveis em três parentelas. À esquerda do governo, estavam os campos autonomista, de que o MPL foi emblema, e o neossocialista, onde estava o MTST. Francamente à direita do PT se situou um campo mais variado, autonomeado patriota, graças ao uso dos símbolos nacionais, aí residia o NasRuas.

Esses campos reagiam a tentativas de reforma do governo, que abriram três zonas de conflito.

Uma foi a da redistribuição. Movimentos se protestaram tanto por mais quanto por menos (como os antitaxação) políticas redistributivas de acesso a bens e oportunidades sociais escassas.

Outra foi a da violência. O plebiscito do desarmamento, que Lula perdeu, e a comissão nacional da verdade, que Dilma Rousseff implementaria, suscitaram tanto movimentos por direitos humanos como pelo direito à autodefesa; e os em torno da revisão da lei da anistia –a favor, como contra.

E havia a moralidade. O Mensalão, e sobretudo seu julgamento em 2012, pôs a corrupção no coração do debate público. A moral foi ativada ainda quando dedos institucionais avançaram na cumbuca da vida privada: aborto e casamento entre pessoas de mesmo sexo. Este lado dos costumes foi o que mais encheu rua sob Lula –e foi o que abriu junho de 2013, com duas megamanifestações, a Parada LGBT e a Marcha pela Liberdade e a Família.

Então, desde os anos Lula, havia protestos pequenos e médios de sentidos opostos em cada uma das zonas de conflito. Mas aconteciam em separado. Em 2013, apareceram lado a lado. Neste sentido é que junho foi um mosaico. Movimentos com pautas diferentes –mesmo opostas– protestaram em concomitância, o que produziu o volume extraordinário. Mas também a ausência de agenda e liderança unificadas. Distintos em muito, convergiram apenas na reação política à longa dominação petista.

Dez anos depois, o país está de novo sob ela. Agora a oposição de rua está mais estruturada nos dois lados do espectro político. O aniversário de 2013 é lembrete de que a esquerda não é mais a senhora dos protestos, a direita agora compete pela rua. O quarto governo petista não poderá ignorá-la, sob risco de enfrentar tempo quente como o que sapecou Dilma.

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