Bernardo Guimarães

Doutor em economia por Yale, foi professor da London School of Economics (2004-2010) e é professor titular da FGV EESP

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Descrição de chapéu BNDES juros

Crédito subsidiado aumenta a taxa básica de juros

Expansões no crédito do BNDES têm pouco efeito no investimento total

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Para o debate sobre o BNDES, é importante ter em mente que crédito subsidiado para alguns aumenta a taxa de juros de mercado, a Selic, tornando assim mais caro os empréstimos aos outros.

Explico.

O consumo de morangos no Brasil é igual à produção nacional de morangos mais a quantidade importada e menos a exportada. Essa é uma relação contábil. Sempre tem que valer.

Algo similar se aplica ao nível de investimentos numa economia.

O montante de investimento em uma economia é igual ao que as famílias poupam (suas rendas menos consumo e impostos), mais o que foi poupado pelo governo (o superávit do setor público) e mais o que tomamos emprestado dos estrangeiros, em termos líquidos.

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Morangos em plantação no Paraná - Dirceu Portugal - 12.set.18/Fotoarena/Folhapress

Agora, considere uma política de crédito subsidiado que leve a mais investimentos de empresas que não tomariam empréstimos a taxas de mercado. Esse aumento no investimento precisa necessariamente ser compensado por uma combinação de quatro coisas: (1) outras empresas investem menos; (2) as pessoas poupam mais; (3) o déficit do setor público cai; (4) recebemos mais capital estrangeiro.

Começo pelo item (4). Se Luxemburgo quisesse construir uma nova ferrovia com financiamento externo, tomaria empréstimos de outros países sem afetar sua taxa de juros. No Brasil não é assim. Dívida maior leva a juros maiores por aumentar o risco e porque os fundos estrangeiros vão querer um prêmio maior para ter mais papéis brasileiros em suas carteiras.

Sobre o item (3), o efeito direto de subsídios é aumentar o déficit público. Pode até haver efeitos indiretos, mas nem mesmo quem defende a expansão do BNDES acredita que isso geraria um superávit do tamanho dos empréstimos oferecidos (sob condições muito mais brandas, o BNDES já seria excelente).

Em suma, (4) não funciona sem aumento de juros e (3) deve até jogar contra. Então, sobra para os itens (1) e (2) resolverem. Ou há menos recursos para as outras empresas investirem, ou as famílias têm que poupar mais.

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Sede do BNDES, no Rio de Janeiro - Lucas Tavares/Folhapress

Como isso acontece?

Se precisamos produzir mais morangos ou consumir menos, é o preço do morango que sobe.

No caso do mercado de capitais, é a taxa de juros que sobe para estimular a poupança das famílias e desestimular o investimento das empresas.

Assim, juros menores para os agraciados com empréstimos do BNDES levam a juros maiores para os outros.

Qual o tamanho desse efeito?

Se pequenos aumentos nas taxas de juros gerassem grande redução no consumo das famílias ou grande injeção de capital estrangeiro, o investimento das empresas não beneficiadas precisaria cair pouco para fechar a conta.

Contudo, essas respostas em geral não são fortes. Assim, muito do investimento fomentado pelo BNDES é compensado pela queda nos investimentos de outras empresas.

Se isso é verdade, variações no montante de crédito do BNDES não deveriam provocar grandes mudanças no nível de investimentos. Os dados são consistentes com essa implicação.

Aloizio Mercadante, presidente do BNDES, em seminário na sede da Fiesp - Bruno Rocha - 12.jun.23/Agência Enquadrar/Agência O Globo

O gráfico a seguir mostra o crédito do BNDES e o nível de investimentos no Brasil (formação bruta de capital fixo) , ambos como proporção do PIB. O tamanho do BNDES variou muito nas últimas décadas (entre 5% e 20% do PIB). O nível de investimentos varia menos e tem pouca relação com o tamanho do BNDES.

Isso acontece porque crédito subsidiado para alguns implica em uma taxa básica maior. Ao fomentar alguns investimentos, o BNDES desestimula outros.

Isso basta como argumento contra a expansão do BNDES, mas mostra que a política industrial não gera investimentos, apenas aloca recursos para alguns setores em detrimento a outros. Os argumentos favoráveis precisam justificar essa mudança na alocação de recursos.

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