Bernardo Guimarães

Doutor em economia por Yale, foi professor da London School of Economics (2004-2010) e é professor titular da FGV EESP

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Bernardo Guimarães
Descrição de chapéu alimentação

Aceita vale refeição?

É a luta pelo direito de cobrar pedágio nos atalhos criados pela lei

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Estão em discussão as regras sobre o Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) e, em especial, a portabilidade dos vales-refeição e vales-alimentação.

Antes de tentar entender o debate específico, vale pensar na questão geral.

Os pagamentos que empregadores fazem aos funcionários são tributados. Para cada R$ 120 que a empresa me paga, eu recebo R$ 72.

Com esse dinheiro, posso comprar cordas para o violão, quebra-cabeças e uma camisa do São Paulo para meu filho. Se a empresa pudesse me reembolsar esses gastos (ou comprar isso para mim) a título de benefícios de lazer, não pagaríamos esses impostos. De R$ 120 pagos pela empresa, eu receberia R$ 120. Mas isso não é permitido, seria evasão fiscal.

Contudo, há exceções.

Por exemplo, a empresa pode ter uma área para os funcionários estacionarem o carro. Por que não poderia? Seria estranho proibir.

Mas aí a empresa que não tem um estacionamento deveria poder também pagar o estacionamento do carro do funcionário, por que não? O meu empregador paga o meu.

Isso significa que eu e meu empregador não pagamos imposto sobre esse dinheiro.

Da mesma maneira, uma fábrica pode ter um refeitório para os funcionários almoçarem. O almoço é servido de graça para os funcionários. Não é um pagamento, né? Não incide imposto.

Bem, a maioria das empresas não vai ter um refeitório. Mas aí não seria justo que estas pudessem transferir um dinheiro para o funcionário almoçar, sem pagar impostos? Se a empresa que tem refeitório pode dar o almoço ao trabalhador, deveríamos dar às outras o direito de pagar por esse almoço num restaurante (e assim escapar do Imposto de Renda)?

Digamos que sim. Como implementar isso?

Uma maneira seria estipular um valor máximo que a empresa poderia dar ao funcionário a título de benefício alimentar. Um pagamento sobre o qual não incidiria imposto. Seria como hoje, só que em dinheiro em vez de vale-refeição.

Fácil e barato, né?

Mas espera: esse é um dinheiro para gastar com comida. E se a pessoa resolver gastar com diversão e arte ou outra coisa para saciar seus desejos, necessidades e vontades?

Bom, não importa, né? A pessoa pode preferir caminhar até sua casa e almoçar o arroz com feijão que o papai cozinhou, pode gastar com outra coisa, qual o problema?

Aí entra a história de zelar pela alimentação das pessoas: é muito importante assegurar que o trabalhador gaste esses recursos com alimentação. Senão ele vai torrar o dinheiro com a coisa errada. Ou vai comer mal e ficar doente...

Aí criam-se empresas que fornecem vale-refeição, cartões, maquininhas. Surge um dinheiro que precisa ser gasto em supermercados, bares ou restaurantes.

Isso tudo só existe porque se criou uma maneira de transferir dinheiro das empresas para as pessoas sem imposto, contanto que se pague um pedágio para quem faz os cartões e as maquininhas, que fazem com que esse dinheiro seja gasto em determinados estabelecimentos.

No momento, discutem-se mudanças nas regras do pedágio desse atalho legal.

As associações de empresas de cartões, maquininhas, restaurantes e aplicativos de entrega de comida, que lucram com isso, estão se posicionando no debate. Procure na internet sobre o assunto e você será direcionado para uma miríade de sites, das empresas envolvidas, explicando que o PAT é um maravilhoso programa que cuida da alimentação dos trabalhadores brasileiros e defendendo alguma regra que os beneficia.

Nossa sociedade aloca muito capital e trabalho para sustentar uma estrutura que visa fazer com que um dinheiro seja gasto com alimentação.

Nós queremos isso?

Podemos não querer?

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