Bianca Santana

Doutora em ciência da informação, mestra em educação e jornalista. Autora de "Quando me Descobri Negra"

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Descrição de chapéu Todas América Latina

Como mulheres negras latino-americanas e caribenhas querem romper com o colonialismo

Organização política coletiva nos permite interromper o genocídio negro e alcançar justiça racial

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"Se o sistema colonial nos fragmentou nas nossas diferenças, é preciso dar um salto político: como vamos construir um projeto de libertação?", perguntou a feminista dominicana Ochy Curiel, radicada na Colômbia, à comitiva da Coalizão Negra por Direitos reunida com ela em Bogotá, em março de 2022. Ochy é a principal teórica do feminismo decolonial e nos provocava sobre nossos próprios movimentos serem excessivamente coloniais. "Para construirmos bem viver, qual o sujeito político hoje?"

É especial escrever sobre Ochy Curiel na semana do 25 de julho, Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e, desde 2014, também Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra. A data foi pactuada em 1992, no 1º Encontro de Mulheres Negras da América-Latina e do Caribe, em Santo Domingos, República Dominicana, país natal de Ochy.

Entre os dias 19 e 25 de julho daquele ano, mais de 350 mulheres negras, de 32 países, se reuniram para formular estratégias de enfrentamento ao racismo e ao sexismo. Na ocasião, foi criada a Rede Afrolatinoamericana, Afrocaribenha e da Diáspora, que protagonizou a participação da sociedade civil nas conferências da ONU na década de 1990, especialmente as conquistas de Durban, em 2001.

Luiza Bairros era ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), em 2014, quando criou a lei 12.987/2014, assinada por Dilma Rousseff, que estabeleceu o 25 de julho como o Dia Nacional de Tereza de Benguela, em homenagem à líder quilombola que resistiu à escravidão por menos duas décadas. Luiza Bairros é reconhecida como uma das intelectuais e ativistas mais importantes da história do movimento negro. Militante do MNU (Movimento Negro Unificado) desde o início da década de 1980, e articuladora do movimento de mulheres negras, Luiza cursou um doutorado em sociologia na Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, depois de se formar em administração de empresas e fazer mestrado em ciências sociais. Morreu em julho de 2016.

Uma mulher negra, usando uma blusa clara e um lenço, está sendo entrevistada. Ela fala para um grupo de repórteres que seguram gravadores. Ao fundo, há uma parede decorada com um desenho abstrato em tons de vermelho. A iluminação é suave e o ambiente parece ser um espaço interno.
Luiza Bairros durante entrevista a jornalistas quando era ministra da Igualdade Racial, em maio de 2011 - Edson Silva - 12.mai.2011/Folhapress

Ochy Curiel é antropóloga, professora da Universidade Nacional da Colômbia e cantora. Costuma explicar o feminismo decolonial como um posicionamento político e teórico cotidiano, não apenas categoria epistemológica. Trata o bem viver, proposta indígena latino-americana muito cara também ao movimento de mulheres negras do Brasil, como ética de vida que diz respeito a buscar modos de se relacionar, entre pessoas e com a natureza, sem satisfazer às necessidades capitalistas individuais, mas à coletividade. Conhecimento, para ela, nos permite interpretar a realidade para melhorar estratégias políticas de emancipação.

Interrompi a escrita deste texto para perguntar a Ochy Curiel, por WhatsApp, sobre a relação dela com Luiza Bairros. "Sempre afirmei que as colegas afro-brasileiras foram referência fundamental na minha carreira política e ativista. Lelia González, Sueli Carneiro, Luiza Bairros são quase mães políticas do meu pensamento antirracista como afro-caribenha". Ochy citou o artigo "Nossos feminismos revisitados" publicado por Luiza Bairros na revista Estudos Feministas, em 1995, com o desejo de que seja traduzido para mais línguas, especialmente pela formulação teórica que objetiva transformar a vida, como escreve Luiza, ao final do artigo: "A grande tarefa é potencializá-la [a mulher negra] afirmativamente através da reflexão e da ação política."

Dia da Mulher Negra não para nos dividir ou exaltar uma identidade fixa, como nos acusam. Mas para a organização política coletiva que nos permita interromper o genocídio negro e alcançar justiça racial, reprodutiva, climática, educacional e social, como afirma a Marcha das Mulheres Negras de São Paulo neste 2024. "Por nós, por todas nós, pelo bem viver."

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