Lula recebeu "com muita alegria" o convite da Marcha para Jesus deste ano, mas avisou que "infelizmente" não iria ao evento. Bombardeado por líderes evangélicos na campanha, o presidente decidiu que não era hora de caminhar num terreno que ainda é de poucos amigos.
A relação de Lula com o grupo passa por um dilema que apareceu na carta assinada pelo petista para recusar o convite. A mensagem, cheia de admiração pelo ato e por valores cristãos, foi vista por líderes evangélicos como um gesto generoso. Mas o presidente manteve distância ao criticar, de forma indireta, a propagação de mentiras nos templos.
O número crescente de evangélicos no país já é suficiente para convencer a esquerda a reconhecer a urgência de reduzir resistências nesse segmento. A missão ficou mais complexa depois que, do outro lado, formou-se uma aliança entre líderes religiosos e um político que defendia abertamente suas bandeiras em troca de apoio eleitoral.
O ciclo deixou feridas abertas pelos ataques ao PT na campanha. Também marcou um ponto em que líderes religiosos ampliaram o peso de fatores ideológicos em suas relações com governos, sem abandonar o pragmatismo da busca por benefícios tributários e favorecimento em políticas públicas.
A distância ideológica escancarada nos templos dificulta uma reconversão ao pragmatismo puro —e Lula ainda calcula se o potencial benefício político basta para deixar o passado recente para trás. Nas últimas semanas, o presidente emitiu um primeiro sinal ao encomendar estudos sobre um projeto que amplia a isenção tributária de igrejas, mas parte do governo resiste ao mimo.
A desconfiança é fruto da contradição de religiosos que sabem o custo de viver longe do poder. Estevam Hernandes, o organizador da Marcha para Jesus, fez campanha para Jair Bolsonaro dizendo ser impossível fazer as pazes com Lula. Admitia, porém, que era "praticamente obrigatório" dialogar com o petista se ele fosse eleito, ainda que a contragosto.
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