Camila Rocha

Doutora em ciência política pela USP e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento

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Sem redesenho, Abin continuará à mercê de captura política

Enquanto não houver desmonte de estruturas da ditadura, grupos acessarão dados sigilosos

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A Abin se encontra novamente em meio a acusações de uso político para espionagem de desafetos. Ao final do governo de Michel Temer a agência adquiriu um software chamado FirstMile, que teria sido usado durante o governo Bolsonaro, de 2019 a 2021, para espionar ilegalmente adversários políticos. Na época, o órgão era chefiado por Alexandre Ramagem (PL-RJ), eleito deputado federal pelo mesmo partido de Jair Bolsonaro em 2022.

De acordo com investigação da PF (Polícia Federal), a agência teria monitorado jornalistas, funcionários e autoridades diversas. Na lista de monitorados estão o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia, o atual ministro da Educação, Camilo Santana, e os ministros do STF Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes.

Entrada da sede da Abin, em Brasília - Pedro Ladeira - 20.out.23/Folhapress

As informações colhidas ilegalmente seriam repassadas para um núcleo político ligado a Jair Bolsonaro, como seu filho, Carlos Bolsonaro, alvo da última operação da PF autorizada pelo STF. Até o momento, apenas Alessandro Moretti, da diretoria-adjunta da Abin, foi exonerado na terça-feira (30), por decisão de Lula. O PSOL já anunciou que deve entrar com um pedido de cassação do mandato de Alexandre Ramagem, cujo interrogatório está agendado para o dia 27 de fevereiro.

A Abin deveria ser uma agência de inteligência voltada à defesa nacional, de forma análoga à CIA nos Estados Unidos. No entanto, seu desenho institucional opaco, a falta de investimento e a parca fiscalização de suas atividades ampliam a possibilidade de captura política. Em 2002, a operação que apreendeu dinheiro vivo em uma empresa de Roseana Sarney, então pré-candidata pelo PFL à Presidência, teria contado com envolvimento de agentes da Abin. Seis anos depois, o então diretor do órgão, Paulo Lacerda, foi afastado após a agência ter sido acusada de grampear ilegalmente parlamentares e o ministro do STF Gilmar Mendes.

No caso específico da arapongagem bolsonarista, porém, a captura política da agência também se relaciona com o histórico que precedeu sua criação, como aponta a historiadora Priscila Carlos Brandão. Afinal, a Abin é herdeira do Sistema Nacional de Informações (SNI), criado logo após o golpe de 1964 a partir da compilação prévia de dossiês de indivíduos e grupos comunistas, ou cujas atividades fossem suspeitas de "subversão", que teriam totalizado cerca de 400 mil unidades, de acordo com o historiador Hernán Ramírez.

Desde a criação da Abin, em 1999, há uma acirrada disputa entre militares e civis por seu controle. No entanto, ainda que a agência esteja sob a supervisão de civis, tendo em vista tal histórico, enquanto não houver um desmonte completo das estruturas de perseguição vigentes na ditadura, militares, agentes e políticos bolsonaristas poderão ter acesso a informações sigilosas do governo, do Judiciário e da sociedade brasileira.

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