Cecilia Machado

Economista-chefe do Banco BoCom BBM, é doutora em economia pela Universidade Columbia

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Contratados por um app

Economia 'gig’ exigirá reconhecer que a flexibilidade pode ser uma vantagem

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Para a maioria das pessoas, especialmente no Brasil, o conceito de trabalho na "economia gig" tem sido sinônimo de prestação de serviços de transportes ou entrega de comida em plataformas. Mas a rápida velocidade com que os aplicativos estão mudando a forma como vivemos está reconfigurando o mercado de trabalho de forma muito mais ampla.

Se, há mais ou menos uma década, a "uberização" do trabalho poderia parecer um fenômeno restrito ao Uber ou ao iFood, hoje, a "economia gig" já alcança diversos outros segmentos, que vão de reparadores, designers, revisores, enfermeiras e profissionais de saúde a serviços profissionais como os de advogados e consultores. O que estaria então acontecendo no mercado de trabalho para aqueles que passaram a ser contratado por um app?

De um lado, a divisibilidade de um emprego em tarefas traz independência e flexibilidade ao trabalhador, que pode escolher em quais dias trabalha, em quais horários, e por quanto tempo. Além disso, o acesso a um mercado amplo maximiza as oportunidades de negócio.

De outro, uma estrutura de mercado que oferece pouca margem para negociações também pode deprimir agressivamente as condições de trabalho, especialmente para os menos qualificados e com menos alternativas de emprego.

É nesse sentido que as diversas propostas regulatórias que estão surgindo buscam equiparar os trabalhadores da "economia gig" aos arranjos tradicionais, como forma de garantir direitos mínimos que empregados de uma empresa possuem. Mas o ponto de partida na elaboração dessas propostas também deveria levar em conta o efeito desses novos arranjos trabalhistas no bem-estar da população e as implicações de equiparar, regulatoriamente, mercados tão distintos. A evidência, ainda que incipiente, já chega a algumas conclusões importantes.

Alguns estudos já são capazes de documentar ganhos substanciais para compradores e vendedores de serviços nessas plataformas e mostrar que uma regulação mais estrita pode prejudicar mais que ajudar os trabalhadores que oferecem seus serviços através dela, como acontece para trabalhadores do conhecimento (por exemplo, programadores, arquitetos, contadores).

Nesse segmento, as tentativas de redistribuir o excedente através da imposição de uma regulação tradicional —como impostos sobre a folha e salário mínimo— traz perdas tanto para consumidores quanto para trabalhadores.

Já no caso de motoristas de aplicativos, como o Uber, a evidência é que os ganhos para os trabalhadores nesse arranjo são mais que o dobro em comparação a um arranjo menos flexível. Intuitivamente, a plataforma permite que os motoristas escolham horários quando a demanda (e, por consequência, o preço) dos serviços é mais alta ou evitar corridas quando outras questões (como cuidar de um membro da família) ganham prioridade.

No Brasil, equiparar trabalhadores da "economia gig" aos trabalhadores tradicionais traz ainda mais desafios, já que a informalidade continua sendo a forma através da qual a nossa regulação trabalhista vem sendo flexibilizada.

Uma bem-intencionada equiparação de direitos poderá falhar em redistribuir o excedente gerado nesse novo modelo, ampliar a informalidade e pôr fim a um conjunto de outros ganhos que os serviços fornecidos pelos aplicativos proporcionam à sociedade.

Avançar na garantia de direitos para os trabalhadores da "economia gig" exigirá reconhecer que a flexibilidade pode ser uma vantagem.

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