Celso Rocha de Barros

Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra) e autor de "PT, uma História".

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Celso Rocha de Barros

O parlamentarismo do difícil

Bolsonaro pode se tornar irrelevante, mas vai querer reivindicar crédito

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Nas próximas semanas, o Brasil pode entrar em um período de alguns meses de parlamentarismo.

Bolsonaro não consegue fazer nada de útil, o Brasil precisa ser governado, os vizinhos de praça dos Três Poderes parecem dispostos a assumir a tarefa.

A primeira iniciativa nesse sentido pode vir na tramitação da reforma da Previdência. Deputados e senadores devem melhorar muito a reforma da Previdência enviada pelo governo. Devem cair as mudanças no BPC, a capitalização, a desconstitucionalização que permitiria revogar a PEC da Bengala com maioria simples, tudo que é obviamente injusto, insustentável ou estelionatário.

Se Bolsonaro conseguir destruir a própria reforma, os congressistas podem tentar a do Temer.

A novidade é que os parlamentares podem não esperar a articulação política do Planalto para tocar qualquer um desses projetos.

Parte disso pode ser pressão dos governadores, que também querem a reforma. Parte pode ser, é preciso admitir, responsabilidade diante da nação, ou diante dos setores econômicos que elegeram os deputados conservadores.

E parte pode ser o lobby de empresários amigos do presidente, que, como revelado pelo O Estado de S. Paulo, estão atuando pesado nos bastidores para convencer os deputados, sabe lá Deus como. 

Em uma virada ainda mais surpreendente, o Congresso deve começar a discutir uma proposta de reforma tributária própria. Se for mesmo algo na linha do que vinha sendo proposto pelo economista Bernard Appy, pode ser muito bom. A maioria das campanhas presidenciais namorava esse projeto, porque ele resolve problemas muito difíceis.

Nesse caso, o Congresso não vai só dispensar a articulação do presidente. Vai dispensar sua iniciativa.
Se isso tudo acontecer, Bolsonaro vai se tornar completamente irrelevante por vários meses, talvez anos.
E o presidente parece estar achando isso um bom negócio.

Na semana passada, deu entrevistas dizendo que não nasceu para ser presidente, que graças a Deus não vai ter que lidar com esse abacaxi pra sempre. Resolveu brigar com o horário de verão. Seu assessor Filipe Martins, um desses coitados para quem o Olavo mentiu que já dava para vir para a discussão sem passar vergonha, parou de tuitar sobre as Cruzadas (pois é) e começou a reclamar da tomada de três pinos.

É golpe.

Se o Congresso fizer todo o trabalho difícil das reformas, as perspectivas de crescimento econômico melhorarão sensivelmente.

É aí que Bolsonaro quer reemergir no Twitter reivindicando crédito pelo crescimento. Vai dizer que, olha só, bastou eleger um cara honesto que a economia cresceu.

Não vai ter sido por isso, e Bolsonaro é Queiroz Boy, mas quem estiver com vontade de acreditar vai acreditar.

Carlos Bolsonaro dirá que a economia foi reativada porque construíram uma hidrelétrica em torno do tuíte do golden shower.

Se o Congresso quiser governar no lugar de Bolsonaro nessa encruzilhada, eu entendo, alguém precisa fazer o ajuste. Mas espero que alguém tenha também um plano de contingência para quando o Brasil tiver no Planalto um fanático autoritário para quem só terá sobrado a parte fácil do trabalho.

Bolsonaro topa numa boa o parlamentarismo no que for difícil, mas não se enganem: nunca vai desistir do presidencialismo no que for fácil.

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