Celso Rocha de Barros

Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra) e autor de "PT, uma História".

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Celso Rocha de Barros

Brasil não terá estabilidade sem direita responsável com ambição presidencial

Não me parece óbvio que Tarcísio, Caiado ou Zema sequer tenham interesse em moderar o bolsonarismo

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Poucas coisas fazem mais falta ao Brasil do que uma direita responsável que, como o PT e o falecido PSDB, se especialize em ganhar eleições presidenciais.

Desde os anos 1990, os partidos brasileiros se especializaram em coisas diferentes. O PT e o PSDB, cada um com seus aliados mais tradicionais (PC do B, PFL, etc.) disputavam a Presidência. Outros partidos, como o PMDB ou o PP, se especializaram em vender apoio no Congresso a quem elegesse o presidente.

Entre 1994 e 2014, PT e PSDB discordaram sobre quase tudo, mas mantiveram ao menos um interesse comum: a Presidência da República, como instituição, tinha que continuar forte.

Lula (PT) recebe a faixa presidencial de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) na posse do primeiro mandato do petista
Lula (PT) recebe a faixa presidencial de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) na posse do primeiro mandato do petista - Lula Marques - 1º.jan.03/Folhapress

Com a crise do PSDB, a liderança da direita passou para os bolsonaristas. Mas o bolsonarismo não se especializou em vencer eleições presidenciais. Especializou-se em golpe de Estado.

Enquanto o golpe não vinha, Jair evitava o impeachment entregando para o Congresso absolutamente tudo que o centrão queria. E quando um Rodrigo Maia da vida aprovava alguma reforma por iniciativa própria, isso até lhe ajudava: dava a impressão de que o Guedes trabalhava.

Desde a crise do PSDB, portanto, o PT não tem um rival com quem compartilhe o interesse em preservar a instituição da Presidência da República. E isso é ruim, porque a esquerda não tem força para fazer isso sozinha. E o Executivo ainda é o único Poder que tem algum incentivo eleitoral para, por exemplo, manter o equilíbrio das contas públicas.

Sim, às vezes o STF pode ajudar a preservar a Presidência, até pela promiscuidade do centrão com o golpismo. Mas isso não é um arranjo estável, e tem potencial de descarrilhamento.

Não vejo cenário de estabilização institucional sem que a direita brasileira volte a ser liderada por um partido ou movimento não golpista com ambições presidenciais.

E isso não está acontecendo.

Para começar, a direita precisa decidir que sistema de governo defende. As propostas de "semiparlamentarismo" deram uma sumida, mas muita gente no centrão parece confortável com a tendência de progressivo enfraquecimento da Presidência da República dos últimos anos.

Afinal, a direita sempre controlou o Congresso, graças à gambiarra de começar nossa democracia com a classe política herdada da ditadura. Já que não dá para ganhar a Presidência, pensam, vamos levar o poder para o lugar onde a gente sempre ganha.

Do outro lado, os principais presidenciáveis de direita até agora são postes do golpe. Até entendo que candidatos conservadores busquem os votos bolsonaristas, ou o apoio das igrejas bolsonaristas. Mas nenhum parece disposto a construir um movimento dentro do qual os bolsonaristas sejam uma minoria disciplinável.

Não me parece óbvio que Tarcísio, Caiado ou Zema sequer tenham interesse em moderar o bolsonarismo. Quando têm, topam terceirizar a tarefa para Alexandre de Moraes.

Em algum momento dos anos 1990, o social-democrata Fernando Henrique Cardoso olhou para a direita brasileira, suspirou de desgosto e disse "OK, dá aqui essa porcaria, vocês não sabem fazer". Quem teria disposição para assumir essa tarefa civilizatória hoje em dia? Por que, com as emendas dando grana e as igrejas dando voto, a direita de hoje se deixaria civilizar?

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