Cada vez que escrevo go-ver-no para me referir ao coletivo de tresloucados que nos desgoverna, sinto como se escrevesse a palavra errada.
Go-ver-no pressupõe saber para onde se está indo, ainda que não se concorde com a direção. Em tese, governos se estruturam com base em programas, diretrizes, planos, ações. Pelo menos alguma convicçãozinha é de bom gosto que um governo tenha.
Nem que seja para disfarçar. No caso brasileiro, o bom gosto passa longe e o bom senso, vai junto. Daí fica aquela saia justa. Promete a Coronavac, depois desmente a Coronavac, no fim compra a Coronavac.
Isso sem falar em certas declarações. “Está todo mundo errado, no meu entendimento. Pode ser que eu esteja equivocado.” Ou então, sobre a ditadura militar: “O Brasil vivia um regime de...um pouco diferente do que temos hoje, mas de muita responsabilidade com o futuro do país”.
“Um pouco diferente” também não parece a definição correta para tortura, inflação e dívida externa. Diante da inadequação do vocábulo para descrever o salve-se quem puder que a gente vive, decidi trocá-lo por outra palavra, mais representativa, sempre que preciso falar em go-ver-no.
Mais: ao ler o jornal, agora eu substituo os nomes dos ministros, de certos órgãos e, claro, do presidente, por termos mais exatos.
Manicômio diz ao MPF que usou cloroquina da Fiocruz destinada à malária para Covid. Com vacinas em falta, charlatão promete imunização geral em 2021.
Xavequeiro condiciona auxílio emergencial a Banco Central autônomo. Inquisição convoca grupo para revisar o Programa Nacional de Direitos Humanos, que prevê desarmamento e a defesa de minorias.
Encontramos convergências, anuncia vira-lata sobre chamada com secretário de Biden. Casa da Mãe Joana inicia ações preparatórias para leiloar oito parques nacionais.
Pinóquio afirma que não falou em tratamento precoce, falou em atendimento precoce. Rei da pegadinha diz que Maranhão não tem motivo para reclamar sobre leitos de UTI. Sete-Peles estuda lançar assessor do gabinete do ódio a deputado federal.
É um exercício quase tão bom quanto completar palavras cruzadas. Democrático, não tem hora, nem lugar para praticar. Você bota o olho e pimba. Troca go-ver-no por Titanic. E, de repente, tudo faz sentido.
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