Clóvis Rossi

Repórter especial, foi membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.

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Na Itália, as máfias não vivem sem os políticos; no Brasil, não é igual?

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O mafioso Salvatore "Totó" Riina durante julgamento em Palermo, na Itália, em 1993
O mafioso Salvatore "Totó" Riina durante julgamento em Palermo, na Itália, em 1993 - 4.mar.1993/AP

Como há alguma frequência na comparação entre a Lava Jato e a italiana ”Mãos Limpas", sugiro prestar a maior atenção à entrevista que “El País” publicou nesta sexta-feira (23) com Nino di Matteo, juiz que investigou os vínculos entre o Estado italiano e a “Cosa Nostra" e que, por isso mesmo, está sob proteção já faz 25 anos.

O ponto que liga Brasil e Itália, no quesito corrupção, é precisamente o dos laços entre mundo político/poder público e as máfias, mesmo quando, no Brasil, elas não estejam tão articuladas como na Itália. Ninguém chama os presos da Lava Jato de mafiosos, mas é isso que são.

Primeiro ponto a chamar a atenção na entrevista de Di Matteo é exatamente esse.

Transcrevo a pergunta do jornalista Daniel Verdú, correspondente de “El País” na Itália, e a parte principal da resposta:

P - O que seria a máfia sem a política?

R - Respondo com as palavras de Salvatore Cancemi, um colaborador da Justiça [delator premiado, no léxico brasileiro], que pertencia à direção da “Cosa Nostra”. (...) Depois de um interrogatório longuíssimo, me disse: “Doutor, Totó Riina [um dos maiores capos mafiosos, morto recentemente] muitas vezes me dizia: 'Sem a relação com a política, seríamos um bando de chacais [criminosos comuns]. O Estado nos teria esmagado a cabeça facilmente. Essa é nossa força e devemos continuar cultivando-a'”.

Transplante agora essa concepção para o Brasil e é fácil concluir que, sem o conluio política/empresas, haveria apenas bandos de batedores de carteira, em vez do portentoso assalto aos cofres públicos que a Lava Jato está expondo.

O ponto, para o futuro, é saber se esse laço pode ser interrompido e, aí, volto a entrevista de Di Matteo, agora no ponto em que toca na atualidade político-eleitoral italiana.

O juiz lembra que uma sentença definitiva demonstrou que Silvio Berlusconi, várias vezes premiê, “teve relações com a máfia siciliana. Subvencionou-a, lhe deu dinheiro (...) em um período em que a máfia matou dezenas de pessoas das instituições italianas".

Não obstante, Berlusconi, impedido de candidatar-se ao pleito de 4 de março, é o poder nas sombras da coligação que lidera as pesquisas. Se as urnas confirmarem as pesquisas, completa Di Matteo, “seria o retorno à liderança do país de um sujeito que uma sentença definitiva reconheceu que manteve relações com a ‘Cosa Nostra’ ao menos durante 20 anos".

Voltemos ao Brasil, também em ano eleitoral: ainda que as “Nossas Coisas” não tenham cometido atentados, pelo menos até agora, há um punhado de líderes condenados ou, no mínimo, sob suspeição justificada que podem ser de novo abençoados pelas urnas.

Depois, não adianta reclamar dos políticos.

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