Clóvis Rossi

Repórter especial, foi membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.

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Descrição de chapéu Governo Bolsonaro

Eleição na Europa mede o peso da tribo que os Bolsonaro adoram

Ultra direita avança, mas não ganha

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As eleições para o Parlamento Europeu nunca atraíram muita atenção dos próprios europeus, o que dirá dos brasileiros. Mas a votação deste ano (começa nesta quinta-feira, 23) deveria merecer algum interesse.

Afinal, um dos principais pontos em jogo diz indiretamente respeito ao Brasil: a eleição vai medir o peso atual da tribo que os Bolsonaro adoram: os populistas, nacionalistas, reacionários, ultra direita, xenófobos, antiglobalistas (seja lá o que isso queira dizer), fascistoides, ao gosto do freguês.

Steve Bannon e Eduardo Bolsonaro durante encontro na Flórida
Steve Bannon e Eduardo Bolsonaro durante encontro na Flórida - Reprodução/Twitter

Explico melhor o laço: Eduardo Bolsonaro, o filho do presidente que se acha perito em relações internacionais, mantém contato com Steve Bannon, que foi assessor de Donald Trump durante a campanha e no início do governo. Foi logo afastado por ser inconveniente, até para Trump, que não é exatamente um estadista.

Bannon migrou então para a Europa, para tentar construir uma internacional ultra, chamada Movimento. Está em contato exatamente com a turma cuja força vai ser medida nas urnas europeias desta semana.

É claro que o desempenho dessa tribo poderá, no futuro, ajudar a dar impulso a um movimento similar por aqui, se e quando Bolsonaro resolver governar em vez de ficar com mimimi, em geral idiota.

A ultra direita está crescendo, mas, atenção, não confundir crescimento com triunfo, com obtenção de maiorias em qualquer dos países europeus, exceto na Hungria. Aliás, o líder húngaro, Viktor Orban, é interlocutor querido dos Bolsonaro.

Veja-se o caso da eleição alemã de 2017: a sensação foi o crescimento da AfD (Alternativa para a Alemanha), xenófoba como poucas. Mas quem ganhou foi a democracia cristã de Angela Merkel.

Qual é a graça de dizer que Merkel ganhou? Ela ganhou todas desde 2005.

Já a AfD entrou pela primeira vez no Bundestag, o Parlamento alemão. Aí é novidade (news). Mas com apenas 12,6% dos votos, quando Merkel teve quase o triplo (33%), se somados os votos da sua CDU com os da sua irmã bávara (a CSU).

De alguma maneira, esse cenário vai se repetir agora: a extrema direita vai crescer, dizem as pesquisas, mas os partidos do establishment continuarão a ter forte maioria: só a soma de três famílias políticas tradicionais e europeístas (a direita civilizada, a social democracia e os liberais) daria 419 das 751 cadeiras, maioria absoluta, portanto.

Já os eurocéticos, somando-se as várias correntes em que se dividem, teriam algo em torno de 173 cadeiras, pouco menos do que um quarto do Parlamento.

É um balanço que corresponde aproximadamente aos resultados nacionais: nenhum desses partidos extremistas ganhou eleições, exceto no caso da Hungria.

É ilustrativo o caso de Matteo Salvini, vice-primeiro-ministro italiano e hoje o líder dessa corrente (outro contato frequente dos Bolsonaro): na eleição de 2018, sua Liga ficou com apenas 17,4%, atrás do Movimento 5 Estrelas, outro grupo populista mas de cepa diferente, e até do Partido Democrático (18,7%), apesar deste grupo de centro-esquerda ter tido a pior votação da história, com esse nome ou outros.

Outros exemplos: Marine Le Pen, também nome destacado da ultra direita, teve a metade dos votos de Emmanuel Macron no segundo turno francês de 2017 (66% x 33,9%). Na Holanda, o notório xenófobo Geert Wilders saiu da eleição com apenas 13,1%.

A rigor, fora Orban, o único que conseguiu a maioria dos votos (os válidos) numa eleição recente foi justamente Jair Bolsonaro.

Dá para entender essa situação, tanto na Europa como no Brasil: na Europa, pesquisa recentíssima mostrou que o apoio à participação na União Europeia atingiu o pico. Dois terços dos europeus acham que é uma coisa boa, o mais alto índice desde 1983. Logo, não faz sentido votar maciçamente em partidos eurofóbicos.

No Brasil, vale o que disse para a Itália Nicola Zingaretti, novo líder do Partido Democrático: “Não há dúvida de que a força dos nacionalismos se assenta em uma grande capacidade de localizar os problemas que geram a raiva".

Bolsonaro o fez e ganhou.

A ver, agora, como vai se sair a tribo com a qual simpatiza Bolsonaro. E, principalmente, se vale também para ele a conclusão da frase de Zingaretti: se os populistas são campeões em localizar os problemas que geram raiva, são também campeões na incapacidade de resolvê-los.

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