Colo de Mãe

Cristiane Gercina é mãe de Luiza e Laura. Apaixonada pelas filhas e por literatura, é jornalista de economia na Folha

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Colo de Mãe
Descrição de chapéu Família Todas maternidade

Na maternidade adolescente, ninguém segura a mão de ninguém

Que saibamos nos acolher, em especial neste Dia das Mães; essa fase passará também, é preciso persistir no amor

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São Paulo

Foi na pandemia de Covid-19 que vi a meninice de minhas filhas ir embora. Trancada naqueles anos intermináveis, em meio a paredes de uma casa que um dia deixarei para trás, não me dei conta do momento exato em que a infância delas se foi.

A mais velha adentrou de vez no mundo das mulheres adultas e a caçula ingressou na pré-adolescência com uma força hormonal que eu desconhecia.

Os brinquedos espalhados pelos cômodos desapareceram. Entraram em caixas e, de lá, têm saído aos poucos, como presentes ou doação a outras crianças. Os quartos ganharam portas fechadas, maquiagem espalhada, roupas monocromáticas e uma placa invisível que diz: "Esse é meu território; não entre".

Cena do filme "Tormenta", em que mãe e filho adolescente passam por dificuldades - Reprodução/O Boticário no YouTube

Na correria do dia a dia, com dificuldades oscilando conforme os hormônios, não percebi a solidão destinada a mães de adolescentes, sem mãos estendidas —que já eram bem poucas—, mas só me dei conta da invisibilidade materna como um fator da sociedade moderna quando me encontrei com outras mulheres com filhos na mesma idade.

Foi num evento especial pelo Dia das Mães promovido pela rede d'O Boticário que eu e outras mães pudemos trocar experiências e compartilhar pensamentos, medos, situações e histórias de maternidade em uma fase tão desafiadora. Desafiadora para eles e para nós.

Para além do apelo comercial da data, entender que todas passamos por tormentas e que essas tormentas passarão por nós foi acolhedor, com reflexões e momentos para se emocionar.

Sabemos que a tormenta passa e o amor fica, mas é preciso reafirmar isso e voltar o olhar para o movimento social que nos abandona em um momento delicado da existência humana. Ninguém ensina a ser mãe de adolescente e as companhias constantes e empáticas de outrora somem.

Todos sorriem para os bebês, graciosos que são, e todos entendem e se solidarizam com mães que não dormem, vivem uma interminável dor de puerpério e não conseguem amamentar, mas há um certo abandono com o crescimento dos filhos.

Quando se tem um bebê, o mundo para tudo para recebê-lo. E é realmente uma fase gostosa. As pessoas querem estar junto, mas sem ultrapassar limites. Há diversos manuais de como conviver com uma mãe recém-nascida: leve comida, limpe a casa, não segure o filho, não faça perguntas, a abrace e não apareça para visitar se ela não quiser.

Há todo um mundo social e de compreensão, além de um mercado voltado para esse início de vida dos filhos. Depois, adolescentes deixam de ser tão agradáveis aos olhos dos adultos e tudo muda. Nem mesmo os produtores de conteúdos, que tanto lucram com a insegurança materna dos primeiros anos de vida de um filho, estão preocupados com esse nicho.

Todos somem, todos se vão. Sobram mães e filhos, envoltos em tormentas. E a solidão é grande, embora talvez não consigamos reconhecê-la. Essa invisibilidade piora quando se é mãe solo, sem pai presente, se vive em lar violento ou trabalha-se demais para sustentar um ser que cresceu tão rápido. Não é mais criança, mas ainda não é adulto.

Que possamos acolher nossas dores, especialmente neste Dia das Mães. E se as mãos não se estendem para nós, estendamos umas às outras e as ofereçamos a nossos filhos. É preciso persistir no amor. Vai passar.

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