Bang! Pow! Cabrum! A estridência humana não tem limites. Mix piorado dos filmes da franquia 007 e "Identidade Bourne", "O Agente Oculto" é como uma garrafa de energético vencida e embolorada. Ou seja, não eletriza e ainda pode causar estragos.
Filme mais caro e mais assistido do momento na Netflix, é implacável com o espectador, que sai cheio de hematomas da experiência. Hematomas metafísicos.
Se os clichês, inchados e musculosos, fossem bem escalados e tivessem boa disposição tática, poderiam ser eficientes. Não é o caso.
Ex-presidiário de bom coração tornado assassino a serviço da CIA, Sierra 6, interpretado por Ryan Gosling, se vê perseguido por Deus, Diabo e uma centena de brutamontes.
Entediado com os tiros ao seu redor, e até com Ana de Armas, vai parar em Viena, não para ver as cores de Klimt, mas em busca de um hacker falsificador de passaportes.
Wagner Moura é quem incorpora Laszlo Sosa, uma figura estranha, esquálida e caricata —parece mais um cientista maluco de comédia adolescente ou um Trótski fantasiado de mendigo. É um defeito? Sim, mas dá colorido ao filme, que tem o título original de "O Homem Cinza".
Sierra 6 pede que Laszlo prepare documentos de um país "com palmeiras e sem extradição". Curvado e ardiloso, Moura sugere o Equador, onde, diz ele, existe um bom drinque, o pinolillo, servido com "uma dose generosa de mel".
Apesar da insinuação de que seja um coquetel para impulsos hedonistas, o pinolillo não é bebida que Bond pediria. Feita com milho, cacau e açúcar, mas sem mel, é tipo um Toddy. E, por mais saborosa que possa ser, é típica da Nicarágua, não do Equador. São 1.800 km de erro.
A gafe do roteiro faz lembrar outro ator, bem pior em todos os aspectos, que virou presidente dos Estados Unidos. Num jantar em Brasília, propôs um brinde "ao povo da Bolívia!" Ao menos acertou o continente. Na transcrição do discurso, a assessoria corrigiu o deslize: em lugar de Bolívia, colocou Bogotá, capital da Colômbia. Bang! Pow! Cabrum!
Em "La La Land", longa anterior com Gosling, famoso por ter sido vítima de mais uma gafe —o Oscar que não foi—, a Nicarágua é mencionada numa mesa com vinhos caros: "É um lugar subdesenvolvido e perigoso. E os nativos são desleixados".
Mia, papel de Emma Stone no musical, abandona o namorado ali mesmo, feliz de se ver livre daquela empáfia perdida no mapa e vai encontrar o pianista vivido por Gosling.
Boa-praça, ele acharia a Nicarágua bacana, mas gosta mesmo é de jazz raíz, e implica com a antiga boate de big bands que virou lugar de "samba e tapas".
No seu esforço de catequização, leva Mia a Hermosa Beach, onde fica o Lighthouse Café, instituição da grande Los Angeles, fundada nos anos 1940, antigo palco de Art Blakey a Miles Davis, passando pela nata do west coast jazz.
A casa do farol, ainda uma ilha de saxes e trompetes, mas não só, também é conhecida por bons coquetéis. Como esse. Perfeito para tomar nas noites quentes de inverno e dançar por aí, longe de gafes alheias e porradas, ouvindo Thelonious Monk. E samba.
Kiss Kiss
Ingredientes
- 45 ml de bourbon
- 15 ml de licor de laranja
- 20 ml de suco de limão
- 15 ml de orgeat (para fazer e guardar: junte 250 ml de leite de amêndoas, uma xícara e meia de açúcar, cinco gotas de água de laranjeira e dez de extrato de amêndoa numa panela e mexa até dissolver o açúcar)
Passo a passo
Bata os ingredientes com gelo na coqueteleira e coe para um copo old-fashioned com gelo. Finalize com canela em pó e folhas de hortelã.
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