Gelo e gim

Coluna é assinada pelo jornalista e tradutor Daniel de Mesquita Benevides.

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Brad Pitt mostra os ingredientes de um corpse reviver #2 em 'Babylon'

Criado por volta de 1890, ele é mais um conceito que uma bebida

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Desânimo, fadiga, falta de ar, impotência, ressaca? Beba corpse reviver #2 e reanime o esqueleto!

Podia ser essa a propaganda. Popular levanta defunto, o coquetel, afinal, surgiu para esses fins —especialmente para a ressaca, mal de todos os séculos.

Criado por volta de 1890, o corpse reviver, mais um conceito que uma bebida, com inúmeras encarnações/receitas, uma completamente diferente da outra, era recomendado para se tomar às 11 da manhã. Com a ressalva: a partir de quatro taças o processo regenerador se reverte.

Seu auge foi nos chamados anos loucos, os 1920s, época de alívio gritante, quando o mundo se permitiu mergulhar nos prazeres da vida depois de se ver afundado na Grande Guerra e na gripe espanhola. Um pouco como agora, nessa retomada pós-pandêmica do hedonismo.

O filme "Babylon", do mesmo diretor de "La La Land", Damien Chazelle, exemplifica às raias do exagero o sentimento, com a reconstrução gráfica de orgias tão excitantes quanto grotescas. Das montanhas de cocaína ao deserto da Califórnia, o cenário muda para abrir alas às piruetas do cinema mudo, mostrado como um ambiente de magia e confusão, com a criatividade a serviço dos contratempos.

O drinque corpse reviver - Brent Hofacker - stock.adobe.com

Brad Pitt, ótimo em papéis cômicos, repete em parte seu personagem de "Bastardos Inglórios", valente e insensato, mascando um italiano macarrônico, com grossa ironia. A um só tempo insensível e boa-praça, ele é Jack Conrad, claramente inspirado em John Gilbert, costumeiro par romântico de Greta Garbo, que transitou mal para o cinema falado.

Logo que chega ao bacanal de um grande produtor, um blocão de carnaval à enésima, fechado em uma mansão, com um elefante cruzando o inferninho dantesco, senta-se à mesa e é recebido pelos peitos da garçonete, que roçam seu bigodinho. "Acho que temos um problema", diz ele. "Qual?", preocupa-se ela, com receio de ter avançado demais os faróis. "Essa mesa tem só uma garrafa de champanhe e vou precisar de oito". Vindo dele não parece demais. O pedido continua: "e também dois gin rickeys, dois orange blossoms com conhaque, três french 75s e…você sabe fazer um corpse reviver?".

O ator não precisa de fato deste último, versão art noveau de um energético, como logo fica claro. Ele é capaz de beber uma fábrica de gim, dar um arroto e filmar a próxima cena com o revólver em punho, a espada em riste ou o que seja. Com garbo e galhardia.

Já a personagem de Margot Robbie, uma estrela que ascende rápido demais, com sua beleza selvagem, desnorteadora, não consegue se reerguer do abuso de álcool e drogas, do vício no jogo e da rede de mil amantes. Gata como poucas, misto de Clara Bow e Mabel Normand, super sex symbols dos filmes sem som, gasta as sete vidas na sétima arte e deixa a cena dançando sensualmente, alheia aos gângsteres sádicos que correm em seu encalço.

Para onde ela vai? Quem aguçar os ouvidos há de ouvir os sons longínquos de alguma recepção festiva e ver a silhueta das serpentinas cortando vez por outra as luzes e a promessa de mais um dia raiando na taça oferecida.


CORPSE REVIVER #2

22,5 ml de gim

22,5 ml de suco de limão siciliano

22, 5 ml de licor de laranja

22,5 ml de Lillet Blanc

2,5 ml de xarope de açúcar

3 gotas de absinto

Bata na coqueteleira com gelo e coe para uma taça coupe gelada. Finalize com um twist de limão siciliano.

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