David Wiswell

Escritor, roteirista e comediante americano

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David Wiswell

EUA fizeram a si próprios reféns com ameaça de calote

É mais ou menos como um assaltante de banco apontar a arma para sua própria cabeça e exigir o dinheiro

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Numa negociação só resolvida no último segundo entre a Casa Branca liderada por democratas e a Câmara dos Deputados sob comando republicano sobre a elevação do teto da dívida americana para evitar um calote catastrófico e autoimposto, por pouco não precisamos de um feitiço da Casa Grifinória de Harry Potter para nos salvar de nossa própria estupidez. "Expelliarmus inadimplencius!"—o feitiço para evitar uma catástrofe autoinfligida ou para esfregar a realidade na sua cara.

Então vamos repassar: que devastação estava em risco para a economia dos EUA e do mundo? Por que isso aconteceu, para começo de conversa? E por que é provável que aconteça de novo??!!

Fachada da Bolsa de Valores de Nova York - Spencer Platt - 2.jun.23/Getty Images via AFP

Um calote significaria que: os EUA entrariam em recessão; os americanos coletivamente perderiam US$ 12 trilhões; não teríamos mais como pagar agências governamentais; aposentadorias ficariam estremecidas; milhões de pessoas perderiam empregos; mais de um quinto do país perderia acesso a atendimento médico; o PIB dos EUA encolheria 7%; o mundo perderia a confiança na economia americana; a impossibilidade de pagar nossos títulos de dívida semearia o caos nos mercados americanos; e como esses títulos sustentam a economia mundial, o efeito se espalharia pelos mercados mundiais. Seria o maior desastre voluntário desde o corte de cabelo de Trump.

Por que isso está acontecendo no país mais rico do mundo? Bem, republicanos têm uma agenda que com o equilíbrio de poder atual eles não podem ter, e por isso seu presidente da Câmara, Kevin McCarthy, vem lançando mão dessa ameaça para convencer Joe Biden a negociar. É mais ou menos como um assaltante de banco apontar a arma para sua própria cabeça e dizer "ponha o dinheiro na sacola ou este idiota vai levar bala".

Biden adiou as negociações até o último minuto, na esperança de que McCarthy cedesse, mas ele não cedeu, e o acordo foi selado faltando apenas dois dias para a data prevista do calote. Ironicamente, o acordo recebeu o nome de "Lei de Responsabilidade Fiscal". Descrever esse evento como sendo fiscalmente responsável é como intitular uma iniciativa para atear fogo às casas das pessoas como "Lei de Aquecimento Doméstico". É um exagero e tanto.

Pelo acordo, serão devolvidos US$ 28 bilhões em fundos de ajuda emergencial para Covid não usados e US$ 21 bilhões do novo orçamento de Biden para o IRS (a Receita americana); cerca de 275 mil americanos idosos que recebem auxílio alimentar terão requisitos de trabalho mais duros; a medida vai limitar a assistência financeira a famílias em dificuldades; ela aprova um gasoduto passando pela Virgínia Ocidental e limita a possibilidade de o presidente fazer gastos sem cortes correspondentes.

Os gastos não militares subirão 1% em 2025, e os gastos militares também vão aumentar. Surpresa! Mesmo nossos cortes incluem gastos militares! Adoramos armas de fogo. Adoramos coisas fálicas que você guarda nas calças e mede em milímetros. Como faz a minha mulher!

Os conservadores intransigentes estão insatisfeitos porque isso não corta o suficiente. Nós da esquerda também estamos insatisfeitos, porque é ruim para o ambiente e para as famílias carentes, aumenta os gastos de guerra e elimina verbas para a Receita necessárias para impedir nossos milionários e nossas corporações de sonegar impostos (desse modo recuperando suas verbas). Isso coloca todo o fardo nas costas dos pobres, das vítimas desses novos mísseis e do planeta, já em aquecimento. "Lei de Aquecimento Doméstico" está parecendo um nome muito apto.

A votação final da lei no Senado aconteceu apenas alguns dias antes de este artigo ser impresso (que é o dia oficialmente previsto para darmos o calote; feliz dia do calote!), enquanto estou de férias no Caribe! Por isso mesmo estou torcendo para ainda existir um país quando eu voltar e também para eu não ser feito refém, como a dívida nacional, pelos... republicanos dominicanos.

Por que isso pode voltar a acontecer? Bem, os republicanos já fizeram isso em outra ocasião, quando Biden era o vice de Obama. O simples fato de negociar confere credibilidade a essa tática insana, e este acordo só prorroga o limite da dívida até 2025. Em menos de dois anos isso poderá acontecer de novo. Já estou vendo alguns presságios tenebrosos pelo fato de a dívida estar em US$ 31,4 trilhões, já que é só mudar a vírgula de lugar para o número virar 3,14 (ou Pi), que, lamentavelmente, também se repete para sempre.

Tradução de Clara Allain 

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