Mentiras não são novidade na política americana —não mais do que perucas empoadas bizarras, dentaduras de madeira manchadas de cerveja e sífilis (estou pensando em você, Lincoln). Mas as baixarias cometidas pelo republicano George Santos em sua trajetória de imigrante brasileiro pobre de primeira geração até virar membro da Câmara dos Deputados fariam a própria sífilis corar.
A decisão recente do Departamento de Justiça de acusá-lo por 13 crimes vem coroar uma reputação já manchada por uma enxurrada sempre crescente de mentiras absurdas e suspeitas de fraude que vão desde um caso de estelionato no Rio de Janeiro até um currículo falsificado, passando por indícios de lavagem de dinheiro e a criação de uma entidade beneficente para pets fictícia.
Ao analisarmos seu passado dissimulado e as novas acusações, uma pergunta se impõe: o que será necessário para o Partido Republicano se arriscar a comprometer sua maioria estreita de votos na Câmara e finalmente expulsar o político menos confiável desde a própria sífilis?
Semanas após sua conquista de uma vaga na Câmara, em novembro, veio à tona que Santos tinha mentido sobre ter estudado na Universidade de Nova York e trabalhado nos grupos financeiros Citigroup e Goldman Sachs durante sua campanha.
Depois disso, pessoas próximas fizeram fila para denunciar as muitas mentiras e trapaças a que já teria recorrido para atingir seus objetivos. Uma delas seria ter usado um sobrenome falso "que soava judeu" para arrecadar fundos para sua entidade beneficente para pets, não registrada e extremamente suspeita
Santos teria se justificado afirmando que "judeus doam mais se você é judeu". Esses pets por acaso eram pastores alemães? (Desculpe, Alemanha, piadinha de mau gosto.)
Isso tudo se soma a outras de suas alegações infundadas, como aquela de que seus avós seriam judeus que imigraram para o Brasil para fugir do Holocausto. As histórias de Santos parecem uma boneca matrioska: dentro de uma mentira se esconde outra, depois outra e mais outra. Ando achando que no centro de tudo veremos George Santos fantasiado de Vladimir Putin e dizendo que é dono da Crimeia.
Essa litania de declarações comprovadamente falsas ou impossíveis de serem verificadas inclui as seguintes alegações: sua mãe fugiu do socialismo na Europa e morreu no 11 de Setembro; ele sofreu uma tentativa de assassinato; é dono de 13 imóveis e sua riqueza vem de gerações; foi um dos primeiros pacientes de Covid-19; foi curador de museu, jogador de vôlei, jornalista e modelo da revista Vogue.
Na realidade, Santos é filho de pais imigrantes brasileiros humildes. Graças a eles, o republicano declarou ter cidadania dupla —o que se mostrou outra mentira segundo o tribunal brasileiro que o condenou por estelionato. A corte afirmou que ele era americano em 2010, antes de ele parar de comparecer às sessões. A declaração deve ter soado como "você mente demais para não ser americano".
Depois de ter trabalhado numa firma de investimentos que teria roubado US$ 17 milhões (R$ 85 milhões na cotação atual) de seus investidores, Santos abriu uma empresa, a Devolder (outro pseudônimo que ele às vezes usava), que segundo as informações que ele deu à sua campanha em 2022, faturou entre US$ 3,5 milhões (R$ 17,5 milhões hoje) e US$ 11 milhões (R$ 55 milhões) antes de ser dissolvida.
Documentos indicam, contudo, que a receita dela era de apenas US$ 50 mil (R$ 250 mil, atualmente). Ou a diferença é um exagero comparável apenas ao que foi ouvido por minha agora mulher no Tinder quando ela perguntou sobre meu, digamos, tamanho, ou a cifra terá que ser explicada pelo Departamento de Justiça. Por sinal, o Departamento de Justiça também informou à minha mulher que tratava-se de 11 milímetros, e não 11 milhões de metros.
Tudo isso —mais dezenas de doações de campanha questionáveis e impossíveis de serem checadas, explicadas por motivos que mudam o tempo todo, divergências em registros de despesas, gastos de campanha suspeitos e recebimento de seguro-desemprego enquanto ele supostamente tinha renda— culminou no indiciamento do republicano por sete acusações de fraude, três por lavagem de dinheiro, uma por desvio de verbas públicas e duas por ter mentido para o Congresso.
Em liberdade condicional após ter tido seu passaporte retido e pagado fiança de US$ 500 mil (espero que não tenham aceito um cheque), no momento em que escrevo este texto, Santos ainda é um deputado em exercício!
Depois de os republicanos terem ficado a seu lado ao longo de tudo isso, se ele for cassado, é assustador especular qual será o próximo em quem os republicanos podem apostar. Meu palpite: a sífilis.
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