Elio Gaspari

Jornalista, autor de cinco volumes sobre a história do regime militar, entre eles "A Ditadura Encurralada".

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O cardeal da floresta

De Roma, Francisco mandou um sinal

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O Vaticano fala baixo. O papa Francisco acaba de elevar ao cardinalato o arcebispo de Manaus, D. Leonardo Steiner. Um cardeal na Amazônia já seria muita coisa, mas não foi só. Há três semanas Steiner havia sido nomeado presidente da Comissão Episcopal Especial para a Amazônia.

Se isso não bastasse, Leonardo Steiner nasceu na cidade de Forquilhinha (SC), assim como seus primos Paulo Evaristo (outro franciscano) e Zilda Arns. Esse pequeno burgo fundado por colonos alemães deu à igreja dois cardeais e a médica que revitalizou a Pastoral da Criança. Seu processo de beatificação tramita na Santa Sé. (Ela morreu em 2010, durante o terremoto do Haiti.)

Leonardo Ulrich Steiner, 71, arcebispo de Manaus - Alan Marques - 18.fev.15/Folhapress

Saíram de Forquilhinha três bispos, 58 padres e mais de cem irmãs de caridade. Em 2005 João Paulo 2º mandou D. Leonardo Steiner para a prelazia de São Félix do Araguaia, antes ocupada por D. Pedro Casaldáliga.

Falando baixo, em 1964 o Vaticano afastou da Arquidiocese de São Paulo o regalesco cardeal D. Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta. Anos depois chamou para Roma seu sucessor, D. Agnelo Rossi, que se aproximara demais da ditadura.

Para o lugar, o Papa Paulo 6º mandou um religioso pouco conhecido: Paulo Evaristo Arns. Ele viria a se tornar um campeão na defesa dos direitos humanos. Falando baixo, Roma também mudou o arcebispo do Rio de Janeiro, trocando o bisonho D. Eusébio Scheid, por D. Orani Tempesta.

Durante os pontificados de João Paulo 2º (1978-2005) e de Bento 16 (2005-2013) a Igreja Católica brasileira viveu um período de sedação política. O papa Francisco poderia ter nomeado cardeais para Porto Alegre ou Fortaleza, que já os tiveram.

Em vez disso, nomeou o primeiro cardeal da Amazônia, região do Brasil cuja conquista muito deveu aos missionários jesuítas, carmelitas e franciscanos. Jesuíta era o padre Antônio Vieira, que chegou ao Maranhão em 1652.

Passaram-se 370 anos, o mundo é outro, mas na Amazônia reabriram-se as feridas da luta pelos direitos dos povos indígenas. Ao tempo de Vieira eles eram escravizados (inclusive pelos jesuítas) e hoje sofrem ataques de garimpeiros e agrotrogloditas que lhes invadem as terras. Vieira perdeu a parada e acabou em Lisboa.

Quem olha o mapa do Brasil pode imaginar o que foi a conquista da Amazônia durante o período colonial. As terras a oeste de uma linha que ia da ilha de Marajó a Santa Catarina eram da Espanha. Ao norte, Inglaterra, França e Holanda, as potências da época, bicavam na expectativa de acesso à margem do rio Amazonas. As tropas e, de certa forma, os padres, garantiram a posse do vale. Hoje, a opção pelo atraso acordou um pedaço da agenda do tempo de Vieira e com ela veio a questão do meio ambiente.

No século 17 tornou-se Papa Urbano 8º, o cardeal Barberini. Ele tirou o bronze da cúpula do Pantheon romano para enfeitar a Basílica de São Pedro. Dizia-se na cidade que aquilo que os bárbaros não fizeram os Barberini cometeram. Para os indígenas, Urbano foi um anjo e excomungou os predadores.

A nomeação de um cardeal para a floresta é um sinal para o garimpo ilegal e seu braço no crime organizado, bem como para os agrotrogloditas da região. D. Leonardo receberá o barrete sendo pouco conhecido fora da região e da Igreja Católica. Em 1970, muita gente se perguntava quem era o bispo Paulo Evaristo Arns.

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