Elio Gaspari

Jornalista, autor de cinco volumes sobre a história do regime militar, entre eles "A Ditadura Encurralada".

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Elio Gaspari

Lula delira nos improvisos

Eles vão do voto secreto no STF a um monólogo com o Nazareno

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Em julho, depois de peregrinar por depósitos, uma imagem de 1,50 metro do Crucificado chegou ao Planalto nos braços de um funcionário que a colocou sobre uma mesa. Lula aproximou-se e, dirigindo-se à peça, disse:

"Eu já voltei, agora você vai voltar. Juntos, nós vamos mudar este país." (O vídeo está na rede.)

Teria sido uma prece em voz alta.

Lula fala com imprensa após G20 em Nova Deli, Índia - Anushree Fadnavis-11.set.23/Reuters

Dias antes, numa frase mal formulada, ele disse numa passagem por Cabo Verde que "temos profunda gratidão ao continente africano por tudo que foi produzido durante 350 anos de escravidão no nosso país".

A assessoria pessoal do presidente aconselhou-o a cuidar melhor de seus improvisos. De alguma forma, a recomendação funcionou e ele passou a ler seus discursos. Bastaram dois meses e ele a atropelou.

A última foi sua investida contra o Tribunal Internacional de Haia:

"Quero estudar muito a questão desse Tribunal Penal Internacional. Até porque os Estados Unidos não é signatário, a Rússia não é signatária. Quero saber porque o Brasil é signatário de uma coisa que os Estados Unidos não aceitam".

O Brasil aderiu ao tribunal de Haia durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. Os Estados Unidos não aderiram porque não passa pela cabeça de um americano que um tribunal internacional condene um de seus cidadãos. (Os Estados Unidos ajudaram a criar o tribunal de Nuremberg, depois da Segunda Guerra, para enforcar uma parte da elite política e militar da Alemanha nazista.)

De lá para cá, os governos petistas prestigiaram a corte de Haia. Jair Bolsonaro foi denunciado duas vezes, pela sua conduta durante a pandemia e pelo tratamento que deu aos yanomamis.

Explicando-se, Lula disse que "nem sabia da existência desse tribunal." Vá lá, ninguém é obrigado a saber de tudo.

Mais robusta, contudo, foi sua defesa dos votos secretos nos julgamentos do Supremo Tribunal Federal. Não só pela proposta em si, mas também pela forma como a apresentou, em duas frases:

"Este país precisa aprender a respeitar as instituições." "A sociedade não tem que saber como é que vota um ministro da Suprema Corte."

Este país respeita as instituições e é por isso que Lula está no Planalto. Ademais, este país lhe deu o mandato de presidente da República, não o de bedel.

O voto secreto em tribunais colegiados é coisa de governos totalitários. Ao defender essa ideia esquisita, Lula deu-se ao luxo de dar um exemplo:

"Votou a maioria 5 a 4, 6 a 4, 3 a 2. Não precisa ninguém saber." Como ele gosta de futebol, poderia tentar esse mecanismo com o seu Corinthians. Como os jogadores, os juízes são avaliados por seus desempenhos.

Uma das pedras de toque da jurisprudência americana para a liberdade de expressão veio do juiz Oliver Wendell Holmes Jr., em 1919. O placar? 7x2. Os dois votos que ficaram na minoria foram o de Holmes, cujo texto é citado até hoje, e de seu colega Louis Brandeis.

Pelo critério do jurisconsulto Lula, a sociedade americana não teria que saber como é que votaram os juízes da Suprema Corte e o texto de Holmes teria ido para o lixo, com prejuízo para o direito e para a língua inglesa.

Brandeis já havia ensinado: "A luz do Sol é o melhor desinfetante".

Para Lula vale um conselho do presidente americano Calvin Coolidge (1923-1929), famoso por não abrir a boca:

"Eu nunca fui prejudicado pelo que não disse".

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.