Elio Gaspari

Jornalista, autor de cinco volumes sobre a história do regime militar, entre eles "A Ditadura Encurralada".

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Lula evitou a frigideira

Mandar Amorim para a reunião no Caribe foi ótima ideia

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Se Lula fosse para a reunião dos presidentes da Venezuela e da Guiana que começa nesta quinta (14) numa ilha do Caribe corria o risco de cair numa frigideira de expectativas. Apesar do palavrório de Nicolás Maduro, não se sabe exatamente o que ele quer, muito menos até onde ele é capaz de ir. Na outra ponta do problema, não se sabe o que o presidente da Guiana quer negociar, muito menos se a ExxonMobil aceita discutir seus contratos de exploração de petróleo na plataforma continental da Guiana. Em qualquer dos casos, pesará uma decisão do Tribunal Internacional de Haia.

Essa circunstância dá à encrenca do Essequibo uma diferença com duas grandes, e fracassadas, aventuras militares: a da Argentina nas ilhas Malvinas em 1982, e a do Iraque no Kuwait, em 1990. Naqueles casos, dois ditadores invadiram terras alheias pensando em conversar depois. Deu no que deu. Nicolás Maduro não moveu um só soldado. Anexou o Essequibo nas tipografias de Caracas que imprimem mapas e avisou que quer conversar.

O assessor especial da Presidência, Celso Amorim - Pedro Ladeira - 5.dez.22/Folhapress

Maduro não quer terras, quer royalties. Logo, esse é um litígio para diplomatas e advogados, não para soldados. Como ensinava o embaixador Ítalo Zappa, ao contrário dos enfrentamentos militares, as negociações diplomáticas não pressupõem claros e imediatos vencedores e derrotados. Às vezes, quem perde diz que ganhou e quem ganhou diz que perdeu.

Se Lula fosse à reunião caribenha, o Brasil carregaria a bola de ferro de sua simpatia pelo governo venezuelano. A ida de Amorim permite colocar o Itamaraty na condição de facilitador na criação de prazos e foros para que a Guiana e a Venezuela conversem.

Pouco a ver com mediação, pois com o seu plebiscito de fancaria, Maduro envenenou a questão. Como a disputa pelo Essequibo tem quase dois séculos, um ano para cá, dois para lá, fariam pouca diferença.

Caso Lula aparecesse na foto, a reunião ao fim da qual se decide apenas continuar conversando poderia ser considerada um fiasco, por alimentar expectativas. Com a ida de Amorim, ela pode ser vista como um primeiro passo, mesmo que não se saiba para onde.

Toda a retórica venezuelana pode ser contida se, enquanto o litígio estiver sendo negociado, Maduro aceitar uma situação na qual sua estatal petrolífera concederá licenças de exploração de petróleo na plataforma da Guiana, sem mover equipamentos. Esses contratos, como o mapa que exibiu, seriam apenas conquistas tipográficas, valendo as folhas de papel em que foram impressas.

Entre o plebiscito e a declaração de Maduro de que está aberto para conversas passou-se menos de uma semana. (No meio, houve um exercício militar "de rotina" de tropas americanas.)

Tudo indica que a teatralidade venezuelana tem um pé na política interna e nada impede que Maduro continue brandindo seu mapa. Afinal, os argentinos continuam dizendo que as ilhas Falklands são suas e chamam-se Malvinas.

Maduro trata os Estados Unidos como "o Império" e o governo americano excita a oposição venezuelana, mas quando a questão girou em torno do petróleo as cabeças esfriaram. Em outubro passado, Maduro soltou cinco presos políticos e Washington suspendeu por seis meses as sanções que bloqueavam a compra de gás e petróleo venezuelano.

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