Esper Kallás

Médico infectologista, é professor titular do departamento de moléstias infecciosas e parasitárias da Faculdade de Medicina da USP e pesquisador na mesma universidade.

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Esper Kallás

'Monkeypox' é sexualmente transmissível

Priorizar a prevenção e combater o preconceito devem ser as ações principais

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Ao ver que a pandemia de Covid-19 já contava com vacinas e tratamentos eficazes, parecia que o rumo seria uma situação sanitária mais confortável a médio prazo.

Mas o que muitos alertavam aconteceu: chegou outra ameaça. Estamos com a reemergência de mais um agente infeccioso com potencial de causar mais uma pandemia.

Causada por um vírus semelhante ao da varíola, a "monkeypox" ocorre em países da África há muitas décadas. O número de casos anuais chega a passar de mil, especialmente na República Democrática do Congo.

Vírus 'monkeypox' em imagem de microscópio eletrônico feito pelo Instituto Robert Koch, da Alemanha
Vírus 'monkeypox' em imagem de microscópio eletrônico feito pelo Instituto Robert Koch, da Alemanha - Freya Kaulbars - 22.jun.22/Instituto Robert Koch/AFP

Como já descrito nesta coluna, a transmissão segue o caminho de contato direto com as lesões, principalmente em crianças e adultos jovens. Isso porque os mais velhos gozam de proteção da vacina contra a varíola, que parou de ser usada nos anos 80.

Estamos assistindo ao aumento do número de casos de "monkeypox" em várias regiões, com mais de 6.000 casos em 52 países (até a conclusão deste texto).

A última comunicação do Ministério da Saúde contabiliza 76 casos confirmados no Brasil, mas o número deve crescer rapidamente. Vários médicos, principalmente infectologistas, estão recebendo muitos casos suspeitos. A confirmação depende de testes que levam dias para ficarem prontos.

A diferença no surto atual é que a transmissão do vírus tem ocorrido também pela via sexual.

A grande maioria dos casos confirmados está associada à descrição de relações íntimas com pessoas que apresentam lesões. Por isso o esclarecimento da forma de transmissão predominante é fundamental.

Deve-se estar alerta à ocorrência de febre e lesões, principalmente nos genitais, de uma a três semanas após uma exposição sexual de risco. Um médico, ou um serviço de saúde, deve ser consultado.

Entre os infectologistas de mais idade, uma sensação de déjà vu começa a se esboçar. A mesma experimentada quando os primeiros casos de Aids começaram a aparecer, no fim dos anos 70 e início dos anos 80.

Naquela época, o início da pandemia de HIV/Aids concentrou-se em homens que tinham relações sexuais com homens. O fato desencadeou uma onda de preconceito e discriminação absurda, que não queremos ver repetida.

Como outras infecções sexualmente transmissíveis, esta acabará atingindo a todos os grupos sexualmente ativos requerendo, portanto, ações rápidas e coordenadas.

A primeira envolve a conscientização sobre o que é a "monkeypox", seus sinais e sintomas, para que as pessoas a percebam prontamente.

A segunda é facilitar o acesso e dar celeridade aos testes diagnósticos.​

A terceira é tratar os casos mais graves. Há uma escassez dos dois medicamentos que já se provaram úteis, o que requer discussão estratégica de estoque.

Finalmente, ampliar a discussão sobre as potenciais vacinas. Já existe uma vacina para varíola que usamos no passado. Há várias outras em desenvolvimento. Algumas já foram testadas em estudos de eficácia, chamados de fase 3.

O que se aprendeu com a Covid-19 está colocado à prova. Haverá capacidade para reagir rapidamente contra uma nova ameaça?

Vale reforçar que os capitais, financeiro e científico, empregados no enfrentamento às doenças não são perdidos. O que foi aprendido ajuda a combater a próxima ameaça, com ganho progressivo de capacidade.

Em tempo: não perca a oportunidade de questionar como seus candidatos na próxima eleição de outubro veem o investimento em saúde pública e ciências, no Brasil. A "monkeypox" e outras doenças que virão são boas razões para orientar suas escolhas.

Esta coluna faz parte da campanha #ciêncianaseleições, que celebra o Mês da Ciência.

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