Flávia Boggio

Roteirista. Escreve para programas e séries da Rede Globo.

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Flávia Boggio

Boicote

Ela estava cansada das pessoas que torciam contra o seu presidente

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Ela saiu de casa determinada a prestar um serviço ao país. Estava cansada das pessoas que torciam contra o seu presidente. Das instituições que iam contra os valores da família brasileira. Da imprensa que atacava o governo.

Foi até um supermercado e procurou por produtos com qualquer relação com empresas antipatriotas.

Ligou a câmera do celular e apontou para um sabonete. Aquela marca, disse a seus seguidores, anunciava na Foice de S.Paulo, que vivia de difamar seu presidente. Deveria ser boicotada.

Ilustração de mulher sentada com fogo atrás dela e outros diversos elementos ao seu redor: um arco-íris, um carro, a estátua da liberdade, uma foice e um martelo, uma garrafa e a bandeira do Brasil.
Galvão/Folhapress

Aquela marca de enxaguante bucal? Patrocinadora da Globo Lixo. Boi-co-te! Iria comprar o produto concorrente, para aprenderem a não torcer contra o presidente. 

O mesmo deveria ser feito com a marca francesa de canetas. Aquele tal do Macron só criticava seu presidente. No lugar, ela compraria a caneta alemã.

Mal postou o vídeo e comentários pipocaram. A Alemanha, produtora da caneta escolhida, também criticou Bolsonaro. A fabricante do outro sabonete anunciava na Foice de S.Paulo. E todas a empresas de higiene pessoal patrocinavam a Globo Lixo.

Ela voltou para casa decidida a eliminar todos os produtos que iam contra seu presidente. Xampus, sabonetes, alimentos processados. Se livrou até da bandeira do Brasil, que descobriu ser fabricada na China comunista. 

Pegou a bicicleta —lembrou que a marca do seu carro também patrocinava a mídia mentirosa— e pedalou até seu sítio em Jundiaí. Capinou a terra, comprou sementes e umas galinhas. Iria produzir seu próprio alimento, livre de inimigos do seu presidente.

Logo descobriu que a vida do pequeno produtor era muito difícil. O custo de sementes e de matéria-prima era alto. As pragas e as chuvas intensas arruinaram sua horta.

Seus vizinhos de terra contaram que, com a liberação de mais agrotóxicos e o desmatamento, eles seriam asfixiados pelos grandes produtores. Tudo culpa daquele maldito governo.

Sentada na cooperativa de orgânicos, que ela ajudou a fundar, pegou uma dose da cachaça, que ela mesma produziu, acendeu seu cigarro de palha, com o tabaco que ela mesma plantou, e praguejou: “Vocês estão torcendo contra”.

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