A cidade de São Paulo vive a volta de uma epidemia. Não é como as mais conhecidas, provocadas por vírus ou bactérias. Muito menos por fungos, como na série "Last of Us". Mas tem tanto potencial de destruição quanto um cogumelo assassino.
Esse hospedeiro chega discretamente, com tapumes, placas de incorporadores. Quando menos se espera, chega com tratores, destruindo quarteirões inteiros.
Essa doença é a Predificação Predatória de São Paulo. O agente causador é conhecido cientificamente como "Especulacium imobiliarium".
A princípio, a mazela parece inofensiva, com mensagens em outdoors como "venha morar no bairro mais charmoso de São Paulo". Os nomes dos empreendimentos são arrojados, como West Side Hill, para um prédio na av. Pompeia. Ou Sunflower Peace, para uma quitinete na rua Girassol.
Os chamarizes são os bairros arborizados, com comércio local, boas escolas, vista para o pôr do sol e proximidade do metrô. Para que tantos imóveis caibam, destroem justamente os principais atrativos da região.
Quando menos se espera, surgem edifícios com apartamentos de 20 metros quadrados, na forma de "studios" e "lofts" —formas charmosas de chamar um cativeiro.
Ou enormes prédios de arquitetura europeia, com colunas gregas e telhados parisienses, feitos para neve, conhecida também como "neocafona".
Há também os edifícios comerciais envidraçados, famosos por assassinar pássaros. Um dos mais famosos é o edifício torto da av. Faria Lima, o "Prédio Feio do Largo da Batata". Ou o edifício Tomie Ohtake, que reflete a luz do sol nos vidros cor-de-rosa, dando aos pedestres a sensação de uma badtrip de ácido.
Com o tempo, as calçadas com árvores e casas se tornam ambientes estéreis, com muros que parecem fortalezas e segurança na porta. As escolas viram outros prédios e o comércio local é substituído por minimercados industrializados. O pôr do sol é coberto por novos prédios.
Os moradores das poucas casas temem viajar e, ao voltar, encontrar uma loja da Oxxo no lugar de suas residências.
O valor dos imóveis sobe tanto que a estação de metrô não interessa aos novos moradores abonados. O trânsito da região fica insustentável. Em pouco tempo o bairro é asfixiado e morre.
Especialistas alertam que, se nenhuma providência for tomada, esse será o destino de toda a cidade.
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