Flavia Lima

Repórter especializada em economia, é formada em ciências sociais pela USP e em direito pelo Mackenzie. Foi ombudsman da Folha de maio de 2019 a maio de 2021.

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Cadê as revistas da Folha?

Empresa precisa dizer se está disposta a continuar bancando o produto ou não

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Neste domingo, os leitores da Folha recebem mais um exemplar da revista sãopaulo.

A publicação, que costumava sair todos os domingos, desde o ano passado é quinzenal, como informa o site do jornal.

O fato, por si só, já seria motivo de aborrecimento para o assinante, acostumado a receber o encarte toda semana.

Ocorre que a Folha não está respeitando o prazo que ela mesma ampliou. A última revista, que trazia os melhores restaurantes da cidade, saiu em 30 de junho. Julho não teve edição.

Ilustração ombudsman
Carvall

No ano, foram apenas sete revistas temáticas (oito com a de hoje), abordando assuntos como casamentos ou viagens.

 
Com razão, leitores têm se sentido desrespeitados. É como comprar um plano de TV por assinatura com vários canais e, sem aviso, descobrir que você não tem mais uma parte deles.

Em um longo email, um desses leitores diz que não houve um comunicado oficializando as mudanças, nem compensação em outras editorias do jornal ou no preço.

A inconstância na circulação da revista sãopaulo é sintoma de um fenômeno maior, a crise financeira que se abateu sobre o negócio impresso. Jornais e revistas assistiram à fuga de leitores (e anunciantes) para o mundo digital.

No caso das revistas, o efeito das mudanças foi mais danoso—e, embora não possa ser explicada apenas por isso, a derrocada da Editora Abril certamente é o símbolo mais emblemático desse movimento.   

Qual o sentido de folhear uma revista de moda se a internet oferece infinitas opções ou a graça de comprar um exemplar de celebridades se os próprios artistas passaram a mostrar a sua intimidade de modo bem mais interessante?

Mesmo entre as publicações que conseguiram atrair parte de seus leitores para o meio digital há entraves. No meio digital, os valores para publicidade são mais baixos e não cobrem os custos do papel.

O resultado disso é que a conta ficou mais difícil de ser fechada, tornando o negócio, em muitos casos, insustentável. Gastos com papel, gráfica e distribuição—que são fixos —consomem cerca de 70% do custo total de uma publicação.

Nos tempos de grande circulação, uma página simples de anúncio em uma revista semanal de informação chegava a custar R$ 600 mil pela tabela cheia (sem descontos). Nas grandes revistas femininas, R$ 150 mil.

Mas por que um anunciante continuaria desembolsando esse valor, quando uma blogueira aceita receber uma fração disso e consegue um retorno muito mais rápido? Nas grandes publicações, os anúncios hoje não chegam a um quinto do era cobrado.

A revista sãopaulo (outrora Revista da Folha) tem as suas particularidades. De certa forma, ajudava a seduzir e manter o assinante por meio de textos, fotos e papel diferentes.

A primeira delas, de junho de 2010, tinha 156 páginas—um terço de anúncios. Hoje, uma revista de 60 páginas custa, em média, R$ 35 mil (60% dos gastos com gráfica e circulação e 40% com colaboradores). Os anúncios valem cerca de 15% do custo total.  

A coluna apurou que, pelo menos até 2018, um mês ruim de anúncios era compensado por outro muito bom e assim o negócio se equilibrava. Quando essa dinâmica começou a falhar, passou-se a trabalhar com uma meta mensal de faturamento: se ela não for atingida, a revista não sai.

A trajetória da sãopaulo lembra um pouco a de outra revista, a Serafina. Mais glamorosa, tinha um projeto gráfico diferenciado e um tamanho maior, custando pelo menos o dobro. De mensal e distribuída para São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, a Serafina passou a circular apenas em São Paulo de três em três meses até, pelo visto, sair de cena sem muito alarde— embora o local para anunciantes no site da Folha continue a destacar o produto. O futuro da revista sãopaulo é incerto. 

A coluna apurou que o nome pode ser alterado, sobretudo porque a proposta inicial de tratar de temas variados—que envolviam urbanismo, consumo e arquitetura, além de roteiro amplo de cultura e lazer na cidade —não vem sendo cumprida.

Gente que entende do assunto diz que hoje as marcas querem um diálogo direto com o público que desejam atingir. Por isso que as edições temáticas têm dado o tom nos últimos meses.

 
O apelo ao anunciante tem que se ajustar aos interesses do leitorado e não o contrário. Como regular isso de modo que o negócio sobreviva é um quebra-cabeça complexo que cabe à Folha resolver.   

Nada, porém, justifica a falta de transparência ou de diálogo com o leitor. A despeito das transformações, o serviço prometido tem que ser prestado. Se há mudanças, elas precisam ser informadas com clareza ao leitor. A Folha precisa dizer qual é a periodicidade da revista e se está disposta a continuar bancando o produto ou não.  

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