Helio Beltrão

Engenheiro com especialização em finanças e MBA na universidade Columbia, é presidente do instituto Mises Brasil.

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Helio Beltrão

Aliados improváveis

A cooperação formalizada entre o governo e o centrão beneficia até a esquerda

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Nos anos 1950, psicólogos norte-americanos realizaram um pioneiro experimento sobre as possibilidades de cooperação entre grupos conflituosos. Reuniram duas equipes de 11 jovens, todos com perfil social homogêneo, em um “acampamento de verão” em Robbers Cave (Gruta dos Ladrões), Oklahoma.

Durante os primeiros dias, as equipes ficaram isoladas e desconheciam a existência do outro grupo.

Nesse período, os pesquisadores nutriram laços de companheirismo entre os membros internos, que formam o “nós” ou “in-group”. Mais adiante, as equipes finalmente se encontraram para uma série de competições esportivas com o grupo rival, o “eles” (“out-group”). A hostilidade foi intensa e descambou inclusive em conflitos violentos, cenário esperado.

Os pesquisadores então introduziram uma ameaça (fictícia) ao suprimento de água comum. As equipes esqueceram suas diferenças e se uniram contra o mal maior: a cooperação substituiu o conflito.

O experimento publicado em 1954 e revisto em 1961 tornou-se um clássico da psicologia e traz insights sobre a política brasileira atual.

Plenário do Senado durante sessão solene remota
Plenário do Senado durante sessão solene remota - Edilson Rodrigues/Agência Senado

A cooperação formalizada entre o governo e o centrão suplantou boa parte do conflito cáustico entre Poderes que marcou o primeiro ano de mandato. Ironicamente, a esquerda —sobretudo o PT, mas também o PSDB de Aécio e Serra— se beneficia dessa aliança. São todos aliados improváveis.

Nas eleições, Bolsonaro foi prestigiado em votos por uma aglomeração de grupos que hoje vem praticando afastamento: liberais, conservadores, lava-jatistas, militares, evangélicos e olavistas. Em 2019, ainda pregava o “fim da velha política” e rechaçava a possibilidade de composição com o Congresso.

O corajoso juiz Sergio Moro, símbolo da Lava Jato e do combate à corrupção (em que pesem eventuais abusos ao devido processo legal), não obteve a “carta branca” e saiu de campo provisoriamente.

O centrão, que há tempos conspira ofensivas, farejou a oportunidade de uma cooperação com demais forças contra o inimigo comum que é a Lava Jato. Bolsonaro, pressionado, “realpolitikou” para o bem e para o mal em sua aliança com o centrão: de um lado, ganhou força política para as reformas e contra investigações, e, de outro, se tornou cúmplice fortuito do PT no desmonte da Lava Jato e de seu espírito investigativo.

Parece inevitável que a Lava Jato se converta em força política nas urnas. Moro pode sair candidato à Presidência em 2022, ao lado de Bolsonaro e Lula. E Deltan Dallagnol parece estar se guiando por uma candidatura ao Senado. Inúmeros políticos surfarão na popularidade da operação.

A teoria dos jogos e as pesquisas em ciências sociais preveem que a cooperação tende a ser mais frequente e mais sólida no caso de combate a um inimigo comum do que no de defesa contra mera ameaça aleatória.

Aos demais players políticos para 2020 e 2022 a Lava Jato representa cada vez menos ameaça individual de cunho criminal, cada vez mais oponente político convencional.

Portanto, não apenas corruptos almejam uma frente contra a Lava Jato mas todos aqueles que podem sofrer politicamente contra uma força política nascente com enorme popularidade.

Esse embate não tem vencedor certo: não menosprezemos o establishment unido. A luta contra a corrupção representada pela Lava Jato é uma conquista que precisamos vigiar continuamente.

Na cooperação maior, aquela entre os brasileiros de bem, é fundamental insistir que se investigue o que precisa ser investigado, com poderes para tanto. E, na medida em que haja abusos dos investigadores, que respondam como os demais. Os fins não justificam os meios, e ninguém está acima da Justiça.

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