Hélio Schwartsman

Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

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Hélio Schwartsman

A batalha dos gêneros

Policiar a língua funciona melhor para aplacar a mente do militante do que para resolver injustiças e quebrar preconceitos

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São Paulo

Publiquei na semana passada a coluna "Parabéns aos argentinos", em que felicitava nossos vizinhos pela legalização do aborto. Leitores me escreveram recriminando-me por ter usado "argentinos" em vez de "argentinas", como preferiam.

Já tive mais paciência com a militância linguística. É claro que as assimetrias de poder que há na sociedade aparecem também no idioma, e devemos estar atentos a elas. Mas daí não decorre que a língua seja o melhor campo de batalha para aqueles que querem fazer avançar suas agendas, por mais legítimas que sejam.

O que me incomoda nessa batalha dos gêneros gramaticais é que ela imprime um viés emburrecedor, uma vez que estimula o literalismo dos falantes em vez de apostar em sua capacidade de abstração, uma das marcas da inteligência.

Mesmo usuários pouco sofisticados dos idiomas que fazem distinções de gênero sabem que o gênero gramatical não precisa coincidir com o natural. Em alemão, "Mädchen", a palavra para "mulher jovem", o protótipo mesmo da feminilidade, é do gênero neutro, e ninguém acha que esse incidente linguístico afeta a sexualidade das raparigas teutônicas. Aqui mais perto, no português, o vocábulo "masculinidade" é feminino, o que não basta para tornar menos tóxicas algumas de suas manifestações.

Voltando aos argentinos, já faz décadas que aprendi o português, mas, da última vez que chequei, no vernáculo, o plural que inclui todos os gêneros tinha forma igual à do masculino; o uso da forma feminina é que implicaria a exclusão de todos os legisladores e apoiadores que participaram do processo --o que me parece injusto.

Meu ponto é que devemos escolher melhor nossas batalhas. Policiar a língua funciona melhor para aplacar a mente do militante do que para resolver injustiças e quebrar preconceitos. E, mais do que nunca, precisamos encontrar comunalidades que nos unam, não ressaltar diferenças que nos separam.

Ilustração de Annette Schwartsman para coluna de Hélio Schwartsman de 10.jan.2021
Ilustração de Annette Schwartsman para coluna de Hélio Schwartsman de 10.jan.2021 - Annette Schwartsman

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