Igor Gielow

Repórter especial, foi diretor da Sucursal de Brasília da Folha. É autor de “Ariana”.

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Igor Gielow
Descrição de chapéu Copa do Mundo

Sombra do doping encobre a Rússia

Kremlin quer Mundial como ponto de inflexão no esporte do país, mas sombras não se dissiparam

Moscou

Nos tempos da Guerra Fria, esporte era uma coisa levada a sério pelos regimes comunistas capitaneados por Moscou, em busca de uma prova física de sua pretensa superioridade ideológica.

Basta se lembrar do "futebol científico" dos soviéticos, implodido pela mestiçagem brilhante do Brasil de 1958, para não falar em medalhas olímpicas colhidas aos borbotões por nações socialistas de várias estirpes.

Para ganhar, valia tudo. Inclusive truques sujos patrocinados pelo Estado para melhorar o desempenho dos atletas, personificados na natação anabolizada da Alemanha Oriental.

Quando o comunismo soviético morreu de morte morrida, na virada dos anos 1990, o capítulo parecia ultrapassado. Ledo engano: a Rússia pós-comunista estrelou o mais amplo esquema de dopagem estatal já conhecido. Após longa apuração, perdeu 41 medalhas olímpicas e foi banida dos Jogos de Inverno deste ano.

A Fifa, que escolhera o país para sediar a Copa em 2010, antes do escândalo vir à tona, teve de correr para evitar impacto sobre seu ultralucrativo evento.

Montou uma comissão específica para cuidar do tema, em parceria com órgãos internacionais de controle de doping. Chegou à conclusão de que a seleção russa de futebol apresentou-se "limpa" à Copa.

Para o governo de Vladimir Putin, que tem qualquer tropeço explorado politicamente no Ocidente, é um ponto de honra. O Kremlin quer que o Mundial seja um ponto de inflexão na turva história esportiva do país. Mas as sombras não se dissiparam. Na véspera do embate em que venceu a Espanha, a estrela do time, Tcherichev, teve de negar que tivesse tomado hormônio de crescimento antes da Copa.

Tcherichev precisou responder sobre hormônios em entrevista coletiva
Tcherichev precisou responder sobre hormônios em entrevista coletiva - Kirill Kudryavtsev/AFP

Isso havia sido sugerido pelo seu pai em uma entrevista, que o atacante afirmou ter sido distorcida. Inevitável que o surpreendente desempenho do limitadíssimo time russo, que chegou às quartas de final, gerasse suspeitas.

Assim como não é despropositado pensar em vista grossa da Fifa, entidade não conhecida como exemplo de transparência e retidão.

Por outro lado, há monitoramento internacional intensivo em curso. E o bom senso político sugere que seria nada menos do que suicídio arriscar-se a passar um vexame histórico em caso de recidiva da prática. Isso dito, parece que será preciso mais do que uma Copa do Mundo para a Rússia libertar-se da imagem que criou para si.

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